29.06.2017 - 08:20
Isso é sobre liberdade
Isso é sobre liberdade
Sobre sonhos e escolhas
Sobre o tempo e a paciência
A busca do Ser e não do Ter
Sobre estar e vivenciar
Sobre vales e montanhas
Subidas, abismos e medos
Sobre caminhar
Se perder
E se encontrar
Sobre a neve e a tempestade
As noites frias e dias ensolarados
Sobre novos sabores e outros idiomas
Novas amizades e saudades
Sobre trabalhar
Aprender e se divertir
Sobre ser feliz
No Vale de Chamonix
25.06.2017 - 17:00
Marathon du Mont Blanc
O despertador tocou às 5h45, o quarto já estava claro devido a falta de cortina na janela no Refúgio, em Le Tour, último vilarejo do Vale de Chamonix. O corpo ainda estava dolorido da cobertura da prova de 85 km de ontem e a vontade era continuar dormindo. Depois de postergar por várias vezes, finalmente às 6h15 levantei.
Tinha feito vários planos para esta prova de 42 km que Kilian Jornet participaria. A ideia era fazer uma foto dele que representasse o esporte e a região. A minha escolha, na noite anterior, foi que faria a subida de duas horas até a Aiguillete des Posettes, o ponto mais alto da prova com 2.201 metros de altitude, onde já estive duas vezes e sabia que era o melhor lugar para uma foto com o Mont Blanc ao fundo, apesar de que para isso eu teria que deixá-lo passar e fotografá-lo indo embora, assim o Mont Blanc entraria no enquadramento. Não era o ideal, mas era uma boa opção. O problema era que deste ponto eu não teria tempo de fotografá-lo em mais nenhum trecho da prova. O tempo que eu levaria para descer, depois pegar um ônibus para Chamonix e o teleférico para Planpraz, onde era a linha de chegada… era bem provável que ele chegasse primeiro.
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Esse era o plano, mas o domingo amanheceu nublado e com uma forte neblina, nada de Mont Blanc a vista, e outro fator que me incomodava era que se chovesse, como estava prometendo, este trecho poderia ser eliminado e eles desceriam para Le Tour, do Col des Posettes, por uma variante e não pela Aiguillete des Possetes, e eu ficaria na mão.
Mudei de planos!
Depois de tomar um rápido café da manhã, peguei um ônibus para Argentière e segui para a trilha. Cheguei às 7h15 e o roadbook da prova informava que eles passariam neste ponto por volta das 7h38. Avancei um pouco na trilha para achar um trecho mais isolado. Aqui a cultura de acompanhar as provas é muito forte, seja pelos amigos e familiares ou pelos moradores da região. A lateral da trilha já começava a encher.
Passaram por mim alguns membros da equipe de apoio da Salomon, fazendo a trilha de encontro aos atletas. Carregavam os Soft Flask da Salomon - mini squeeze flexível com água - pois pelo que notei depois, Kilian Jornet não carrega mochila de hidratação.
Às 07:42’13" os atletas fizeram a curva na trilha e entraram em cena no quilômetro nove da prova. Tinha deixado o iPhone a postos no chão. Cliquei em rec e o vídeo começou a ser gravado. Com a Lumix GX8 fiz as fotos e pelo visor da câmera notei que diferente do que imaginava, Kilian Jornet não estava na frente… vinha em segundo, bem próximo do primeiro. Depois que os 10 primeiros passaram, segui a trilha atrás deles… ou melhor, muito atrás deles.
Voltei para o centro do vilarejo de Argentière e iria pegar o ônibus para Le Tour, o quilômetro 28 da prova. O ônibus demoraria vinte minutos para passar. Resolvi colocar o dedo em ação e pedir carona.
O segundo carro que passou, parou, era o francês Olivier, membro da equipe de filmagens da Salomon. Com ele fui para dois trechos da trilha, primeiro fomos para o Col de Montets, quilômetro 13,5 da prova, onde Kilian seguia em segundo, mas agora o primeiro era Max. Depois seguimos para o vilarejo de Vallorcine, quilômetro 17,2 da prova, local que eu já tinha visto lá do alto da Aiguillete des Possetes, na semana passada. Os ponteiros chegaram primeiro que nós, como também uma forte chuva. Eles começaram a subir rumo ao Col des Posetts (1997m), mas deu para ver que Kilian seguia no início da subida em segundo, no calcanhar do primeiro.
Olivier subiu de teleférico para o Col des Posetts. Resolvi voltar de ônibus para Argentière, onde já não chovia mais e de lá peguei uma carona até Chamonix. Fui para o McDonalds, que ainda estava fechado, mas com o seu rápido WiFi disponível. Subi o primeiro vídeo na fanpage do Extremos e da Go To Trail.
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ARGENTIÈRE - 9 quilômetros de uma prova de 42km |
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Segui para a estação de teleférico Brévent e comprei o ticket para subir para Planpraz. Já estive lá duas vezes, uma delas no Tour du Mont Blanc. Na parte baixa ainda estava sol, mas depois de 6 minutos de subida do teleférico, cheguei em Planpraz com uma forte neblina. Encontrei com o Welinton Carius, brasileiro que fez ontem a prova de 85 km e chegou em um honrado 31º lugar. Me despedi dele e fui tentar entrar no meio dos fotógrafos para a imagem da chegada. Estava tudo cercado e tinha esquecido de tirar a credencial de imprensa dias antes. Fiquei atrás do cercado exatamente onde tinham construído uma plataforma elevada para os fotógrafos e cinegrafistas, logo após a linha de chagada. Eles com um posição privilegiada e eu ali atrás não enxergava nada. Faltando apenas cinco minutos para a chegada do primeiro colocado e a agitação nos bastidores da linha de chegada era grande, aproveitei e pulei o cercado e subi na plataforma em meio aos fotógrafos, sem ninguém perceber.
Às 10h46, no meio da neblina surgiu o rapaz franzino de camiseta branca e shorts preto, era Kilian Jornet em primeiro lugar. A multidão a postos nas laterais da linha de chegada foi a loucura. Com a mão de apoio da lente, segurei junto o iPhone, assim aos trancos e barrancos e me espremendo e ganhando espaço com os cotovelos, filmava e fotografava ao mesmo tempo a chegada do “monstro”, como carinhosamente os internautas do Extremos apelidaram Kilian Jornet, depois de suas duas escaladas no Everest, em maio.
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A CHEGADA: Kilian Jornet vence a Marathon du Mont Blanc |
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Às 10h47 chegou o segundo colocado, era o norueguês Stian. Às 10h52 chegou o Max, em terceiro lugar, fechando assim um podium todo do Team Solomon, e às 10h55 um membro da organização me descobriu sem a jaqueta de imprensa e fui convidado a me retirar, o que fiz com a maior satisfação, já tinha conseguido as imagens que queria.
Tirando a emoção de ver a conquista do Kilian Jornet, foi interessante durante todo esse fim de semana ver como a tradição do trail running está enraizada na região, além de toda atividade outdoor. Os atletas de ponta tem uma ótima estrutura de apoio. Eles são realmente os super-homens, fazem a prova em tempo muito rápido, e terminam bem fisicamente, como se tivessem dado uma volta no parque. Mas as provas são muito mais do que isso, a elite de atletas é muito pequena, os anônimos são a grande maioria. Ver as pessoas acompanhando e principalmente apoiando seu marido, esposa, filho ou amigo, foi o que mais me emocionou.
Na prova de 85 km, no quilômetro 60, em Le Tour, vi muitos atletas chorando, pois achavam que já tinham dado tudo de si, e a família sempre consolando e apoiando, e vários deles seguiram para a prova. Ver um pai chegar aos frangalhos e o filho de 5 anos vir abraça-lo e consola-lo, com os avós alguns passos atrás já com uma sopa quente para servir e algumas frutas… faz qualquer um se emocionar... todos se envolvem e não tem como sair incolume de uma experiência como essa.
Viva os esportes, viva a natureza e viva a família, a base de tudo!
21.06.2017 - 12:30
Kilian Jornet e eu, em mais um dia de trabalho.
Acordei às 6h30 no primeiro dia de verão aqui em Le Tour, vilarejo no extremo Sul do Vale de Chamonix. Kilian Jornet, em Chamonix também estava acordando.
Desci para trabalhar na sala do Refúgio, onde além de sofás tem uma mesa de escritório e a internet é melhor. No Brasil era 1h30 da madrugada, mesmo assim encontrei alguns amigos online. Por volta das 8h fiz uma pausa para o café da manhã e logo retornei ao trabalho, respondendo emails e colocando o artigo de um colunista no ar e finalmente enviando para a gráfica o livro Trekking Everest da minha amiga Alessandra Bibas.
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21.06.2017 - PANORÂMICA: Sentado na sombra de um pinheiro, no exato momento em que Kilian Jornet chegava ao cume do Mont Blanc. Foto: Elias Luiz |
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Neste tempo Kilian se deslocava de Chamonix para Les Houches, vilarejo no extremo Norte do vale. Deve ter começado a sua escalada ao cume do Mont Blanc próximo ao Col de Voza (2.350m), local onde passei em 2012, no Tour du Mont Blanc. Ele escolheu a Rota Goûter para a escalada.
Às 10h resolvi fazer uma pausa no trabalho, ainda era 5h da manhã no Brasil. Escolhi fazer a trilha Le Péclerey, que tem início ao lado refúgio. A trilha tem uma ascensão de 700 metros para ser feita em pouco menos de duas horas até o destino. Era a primeira trilha no maciço do Mont Blanc que eu iria fazer nesta temporada.
Kilian Jornet, às 10h da manhã, já tinha passado pelo Refúgio Tete Rousse (3167m) e pelo moderno Refúgio Goûter (3817m) e seguia forte em meio a neve rumo ao cume do Mont Blanc.
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A linha amarela é a trilha do Tour du Mont Blanc. Parte do dia 9, 1o inteiro e início do dia 11 de trilha. Foto: Elias Luiz |
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O trecho inicial da minha trilha foi em um bosque com imensos pinheiros e com uma agradável sombra nos primeiros 30 minutos da trilha. O zigue-zague morro acima parecia não ter fim, e já acima do bosque o sol castigava com os 25ºC e poucas nuvens. Imaginava que a trilha levaria apenas ao Glaciar Tour, que na verdade, como houve o seu recuo devido ao derretimento, não tem muita como a ser vista, a não ser rocha. Por isso mesmo essa trilha é pouco movimentada. Mas imaginava que a descida seria pelo mesmo caminho. A grata surpresa ao chegar no destino da trilha foi ver que ela seguia pela montanha em sentido sul, de frente para o Mont Blanc e desceria pelo outro lado. Gosto de trilha assim, onde não se repete o caminho e sempre tudo é novidade.
Pouco antes das 13h parei na sombra de um pinheiro, ainda na parte alta da trilha, perto dos 2.000m. Sentei em uma pedra e preparei o lanche com os ingredientes que havia comprado no mercado um dia antes. Baguete, queijo artesanal e salame, tudo feito na região. Entre uma mordida e outra no lanche, aproveitava para fotografar a paisagem com o Mont Blanc ao fundo, ainda sem saber que Kilian estava chegando no cume.
Neste momento Kilian Jornet entrava ao vivo em sua página pessoal no facebook e transmitia os momentos finais de sua chegada ao cume. Subiu correndo o trecho final e no cume encontrou outros montanhistas e os parabenizou pelo feito. Esses montanhistas levaram pelo menos dois dias para chegar ao cume. Estavam usando roupas de frio, piolets, capacete, corda, arnes e tudo mais. Kilian Jornet escalou em pouco mais de 4 horas, de tênis, shorts, camiseta, uma pequena mochila de hidratação e um par de bastões de caminhada, ficou um minuto no cume e começou a sua descida, de volta pra Les Houches.
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A trilha desce em meio ao bosque e com o as montanhas nevadas ao fundo. Foto: Elias Luiz |
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Eu começava a minha descida de volta para Le Tour, com o Mont Blanc a minha frente e todo o vale de Chamonix. A descida foi muito mais leve e agradável, e logo cheguei ao ponto onde havia iniciado a trilha, com um total de três horas de trilha.
Kilian Jornet foi ao cume do Mont Blanc como treino para a Marathon du Mont Blanc que acontecerá neste fim de semana aqui em Chamonix. Eu estava treinando para a Kungsleden, a trilha de 30 dias no norte da Suécia, que farei em agosto junto com a Laura Sette.
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Kilian Jornet no cume do Mont Blanc |
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15.06.2017 - 17:40
Extremos pelo mundo
Quando lancei o Extremos, em 2007, vislumbrava a possibilidade de um dia viajar e trabalhar. Um sonho que ficou guardado durante 10 anos. Resolvi que não iria deixar de lado outras fases da minha vida. Tudo tem o seu tempo. Não queria jogar tudo para o alto e algum tempo lá na frente me arrepender por isso. Sabia que de uma forma ou de outra, se fosse para ser, a oportunidade surgiria.
No dia 18 de março de 2017 parti para viver pelo menos 6 meses na Europa. Hoje completa 3 meses que estou aqui.
Os 10 anos de espera surtiu bons efeitos, hoje em dia ficou fácil para tratar das partes burocráticas da minha empresa, o Extremos. Emitir notas fiscais eletrônicas, pagar os impostos, contadora e tudo mais é feito online.
Não tenho mais contas de TV a Cabo, Internet, Netflix, Água, Luz, etc. Lógico, ao invés disso tenho a conta nos refúgios de montanha ou nas hospedagens do Airbnb. Na média o custo de vida continua o mesmo.
Para trabalhar preciso apenas de um wi-fi, e como alguns amigos disseram: “Elias, continue viajando porque você está produzindo ainda mais conteúdo para o Extremos!”
Os podcasts continuam sendo gravados no mesmo ritmo, o interessante é que agora tanto o entrevistado como eu, estamos em locais diferentes a cada programa. Os artigos, matérias e tudo mais continuam fluindo bem. Durante a Cobertura Online do Everest de 2017 estava em Dublin, e novamente o Extremos bateu recorde de acessos, como 45% a mais que em 2016.
A reuniões comerciais continuam a todo vapor, via email, telefone ou skype.
Entendi que para que eu possa manter uma boa produção de trabalho o ideal é que eu não fique pingando de cidade em cidade ou de país em país, o que de início era o meu plano. O custo do pinga-pinga aumentaria os meus gastos, como também a dor de cabeça de a cada semana ter que procurar um novo lugar para se hospedar, como experimentei no início da viagem, quando morei por uma semana em Paris e outra semana em Londres. Depois morei dois meses em Dublin, que foi um momento de economia bem vinda, me hospedei na casa do meu sobrinho. Esse foi o primeiro período para me habituar melhor com a fase de viajar e trabalhar.
Normalmente o trabalho rende muito, estou cinco horas a frente do Brasil. Quando os brasileiros saem para o trabalho, a maior parte do conteúdo produzido já está no ar. Então já amanhecem com notícias novas.
O que eu expliquei neste texto até o momento, não seria muito diferente se eu estivesse em Campinas / SP. É apenas a parte do trabalho e das burocracias. Vim em busca de muito mais.
O foco é no trabalho, mas quando sobra um tempo livre aproveito para fazer as caminhadas ou trilhas, depende de onde estiver. Quando estava em Dublin, Londres ou Paris, a cada caminhada saia para um rumo diferente, acabei conhecendo mais de 15 parques. É gostoso quando cada saída é para um lugar que você nunca foi. Tudo é novidade.
Aqui nos Alpes estou aproveitando para refazer alguns trechos do Tour du Mont Blanc e outras trilhas pela região.
O prazer de vivenciar uma cultura diferente, tendo experiências novas todos os dias e conhecendo pessoas de várias partes do mundo foi o que vislumbrei desde o início. Isso é muito enriquecedor. Acho que como editor do maior portal de aventura do Brasil, isso era o mínimo que deveria me propor como modo de vida. Essas experiências no mínimo enriquecerão a minha forma de ver o mundo como um todo, como também o segmento da aventura. O quanto mais conhecer, mais experiências e visão de um mundo global terei e isso resultará em uma visão melhor nos artigos, notícias e coberturas online do Extremos.
Estou há 15 dias morando no Vale de Chamonix, e devo ficar um mês no total. Seis anos atrás eu nem conhecia o Tour du Mont Blanc e agora depois de ter feito o circuito em 2012, estou de volta e morando literalmente na trilha. O refúgio onde estou é uma opção para quem faz o TMB, e é gostoso sentar na hora do jantar e conversar com os hikers que estão fazendo o TMB, saber de suas aflições e de seus encantamentos com a trilha.
O Col de Balme, que para mim sempre foi o local com a melhor vista de todo o TMB, hoje é o quintal de casa. Pelo menos uma vez por semana subo ao alto do paso para apreciar a vista, para ver os hikers chegando e para treinar para o meu próximo projeto, os 440 km da trilha da Kungsleden, no norte da Suécia.
Uma pergunta que ainda não sei responder é quanto tempo ficarei nesta vida de Extremos itinerante. Pode ser apenas os 6 meses iniciais, como pode ser 1 ano ou mais… não me preocupo com isso no momento. Novamente deixarei que o tempo se encarregue disso. |