Extremos
 
EXPEDIÇÃO GIRAMÉRICA
 
O dia que pedalei com a faca e o spray de pimenta em mãos
 
Texto e fotos: Carol Emboava
4 de fevereiro de 2015 - 12:55
 

Carol Emboava com o spray de pimenta e a faca em mãos, em um difícil dia de sua expedição de bike pela América do Sul.
 

Sempre estou bastante relaxada enquanto estou na estrada. Mesmo assim meu sexto sentido está sempre ligado e é usado quando necessário.

Ontem, no caminho pra chegar a Bariloche, passou por mim um motociclista, desses de cidade, com moto pequena. Buzinou e como de costume levantei o braço para cumprimentar. Segui escutando música e quando fiz uma curva o vi parado, fora da moto a uns 500 metros de onde eu estava.

Nada de mais, mas não sei porque nesse momento acendeu uma luzinha vermelha na minha cabeça. Parei a bike e esperei um pouco. Como o cara tirou o capacete achei que estava tudo bem e pensei que se ele fosse me assaltar não ia fazer isso, claro.

"Desculpa aí por não parar, mas tenho que aproveitar o embalo na subida."

Passei ao lado, pedalando lentamente numa subida e o cumprimentei de novo. Ele tentou puxar assunto, perguntando de onde eu era, mas segui pedalando e disse: "desculpa aí por não parar, mas tenho que aproveitar o embalo na subida".

Poucos minutos depois ele passou por mim novamente, em baixa velocidade e bem perto da bicicleta, o que me fez levar um susto enorme. Achei que ele poderia estar com algum problema na moto quando o vi parado mais pra frente depois, porque estava dirigindo super devagar e parando a cada tempo. Mas ao mesmo tempo, além da luz vermelha, começou a tocar um alarme na minha cabeça.

Parei a bike, desliguei a música porque queria concentração no que estava acontecendo e pela primeira vez peguei o spray de pimenta que uma ciclista me presenteou no fim de sua viagem em Ushuaia. Destravei e testei com um jato de pimenta no acostamento. Na parte de traz da bike levo minhas coisas de cozinha, onde peguei minha faca, abri e puxei a trava.

 
Depois de tantas e tantas voltas... de volta à lendária Ruta 40!!!

Nessa hora eu já estava bastante nervosa, primeiro porque nunca tinha passado por essa situação, segundo porque nunca, jamais queria chegar ao ponto de precisar usar tudo isso, já que eu nem sabia como fazer direito (se bem que na prática eu poderia aprender em 1 minuto).

O motociclista continuava parado no acostamento e quando eu subi na bicicleta vi que ele também subiu na moto, fez uma curva e começou a vir pela pista contrária. Aí eu tive certeza que era problema. Dei sinal pra um caminhão que passou na direção contrária, mas ele estava rápido demais. O cara se aproximou, eu perguntei falando alto "hey, qual é a sua, que foi?" e ele respondeu que era pra eu parar, pra gente conversar um pouco.

Como não tinha muitas opções do que fazer e não passava nenhum carro, dei a volta falando que não ia conversar nada e comecei a descer o mesmo morro que estava subindo. Ele me seguindo com a moto.

"Nesse momento chegam meus anjos do dia, Daniela e seu marido, que pararam o carro na mesma hora que eu sinalizei. O cara da moto fez meia volta e foi embora."

_ disse Carol

 
No melhor estilo supertramp, tá aí mais um hotel 5 estrelas da viagem, o magic bus!

Eu tremia mais que vara verde, tentei explicar o que estava acontecendo e quase começo a falar em português. Fechei a faca, guardei o spray de pimenta e eles desceram do carro. A primeira coisa que ela fez foi me dar um abraço e um beijo. Numa desconhecida! Talvez pelo instinto de mãe ou "apenas" instinto humano mesmo. Mas ali, já com a adrenalina a mil, ter sido envolvida nos braços de alguém me fez chorar, de alívio, de nervoso e de gratidão por estar bem.

Eles me escoltaram uns 4 km até onde eu ia parar. E ali procurei a polícia pra fazer um boletim de ocorrência. No fim eu e Sara Lee (minha bike) ainda ganhamos uma carona do policial, que nos adiantou uns 25 km que iria pedalar no dia seguinte. Cheguei a Bariloche a bordo de uma caminhonete oficial.

 
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