A menina da água
da redação: Elias Luiz
19 de outubro de 2010 - 20:02
 
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  • Foto: Elias Luiz
    A menina do meu lodge enchendo o primeiro de vários galões de água para o lodge. Foto: Elias Luiz
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    Outra menina apareceu fazendo o mesmo processo para o lodge vizinho." Foto: Elias Luiz
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A menina do meu lodge enchendo o primeiro de vários galões de água para o lodge. Foto: Elias Luiz

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19º DIA  

Dhole / Nepal
Em Dhole acordei cedo, por volta das 6h15 já estava lá fora para fotografar o amanhecer. Naturalmente este é o momento mais frio de todo o dia, estava fazendo 4ºC, céu com poucas nuvens e o tempo prometendo um bom dia de trekking. Estamos a 4.040 metros de altitude e aqui o verde já faz parte da paisagem e um bonito riacho corre a 20 metros do lodge.

Desço os degraus feitos na terra e vou a beira do riacho a procura de uma boa composição, de repente surge uma jovem menina nepalesa de no máximo 11 anos, usando um gorro vermelho, blusa rosa e um colete preto por cima. Está de calça jeans, meia e usa um chinelo ao estilo rider, nas suas costas está um galão de 20 litros de água que ela carrega em uma tira presa a sua cabeça. Como todo porteador ela se curva para frente para dividir o peso entre a cabeça e as costas. Caminha lentamente e quando passa por mim sorri e diz Namastê. Atravessa uma ponte de madeira, sobe os degraus na terra e segue em direção ao último lodge e desaparece ao passar pela porta. A distância não é tão grande, por volta de 50 metros.

Fico parado revendo as fotos que fiz e me perco nos pensamentos. Quando resolvi vir fazer o trekking ao acampamento base do Everest, já sabia que iria encontrar muita pobreza, achei que seria algo parecido a Bolívia, mas com o tempo fui percebendo que a situação aqui é bem pior, aqui isso acaba virando uma cultura. Não me incomoda dormir em lodges simples, ficar 13 dias sem banho e a privada sendo um buraco na terra.

Mas a imagem da menina me tocou e enquanto repasso as fotos a menina surge novamente e segue ao mesmo local onde enche novamente o seu galão de água e refaz todo o percurso. Na meia hora que fico ali, vejo-a fazer este trabalho pelo menos umas 7 vezes. Ela fica um pouco acanhada com a minha presença, mas sempre que passa sorri e não deixa de realizar a sua tarefa.

Por volta das 9h30, quando estamos nos preparando para sair para o trekking, a vejo novamente refazendo o percurso com o seu galão de água e lembro que no dia anterior a vi também no final da tarde. Outra menina surge, agora a do meu lodge e também repete o mesmo processo.

Ver crianças realizando essa tarefa é de tocar o coração, ainda mais que um simples sistema de pressão ou elevação de água por um pequeno moinho poderia resolver esse problema de falta de água corrente nos lodges. Aqui a cultura é fazer o mesmo que foi feito pelos seus pais e avós, não se pensa em melhoria e praticidade. Essa é uma tarefa que as ONGs devem fazer, e de fato fazem em outros segmentos, mas o Nepal é carente deste tipo de serviço e mudar essa cultura vai ser difícil. Enquanto isso essas pobres crianças passarão toda a sua vida carregando esse problema nas costas. Participe, deixe o seu comentário logo abaixo.

 
 
 
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