Khajuraho, Agra e Rajastão
da redação, Texto: Pablo e Karina
2 de abril de 2013 - 10:30
 
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  • Foto: Karina e Pablo
    Viajando no bagageiro do trem Foto: Karina e Pablo
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    No bagageiro " Foto: Karina e Pablo
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    Primeiro perrengue da viagem " Foto: Karina e Pablo
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    E depois do trem... segundo perrengue da viagem: viajar 5 horas nesse pau velho!" Foto: Karina e Pablo
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    Apesar do perrengue a vista era sempre muito bonita com esses campos de flores amarelas." Foto: Karina e Pablo
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    Os Templos de Khajuraho. Patrimônio Histórico da Humanidade (UNESCO)" Foto: Karina e Pablo
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    Os Templos de Khajuraho" Foto: Karina e Pablo
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    Nos Templos de Khajuraho" Foto: Karina e Pablo
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    As cenas eróticas esculpidas nos templos." Foto: Karina e Pablo
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    Tirem as crianças de perto do computador... rss" Foto: Karina e Pablo
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    Nós no templo" Foto: Karina e Pablo
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    Pablo se divertindo" Foto: Karina e Pablo
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    Ops...Kama Sutra?" Foto: Karina e Pablo
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    é...então...rsss" Foto: Karina e Pablo
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    O templo" Foto: Karina e Pablo
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    O Taj Mahal" Foto: Karina e Pablo
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    "Foi a mais linda história de amor, que me contaram e agora eu vou contar, do amor do príncipe Shah Jahan pela princesa Mumtaz Mahal... tetete teterete"" Foto: Karina e Pablo
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    Em Agra" Foto: Karina e Pablo
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    Mais um bonito templo em Agra" Foto: Karina e Pablo
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    Pablo se divertindo" Foto: Karina e Pablo
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    Taj e seus lindos jardins — em Agra" Foto: Karina e Pablo
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    Fatehpur Sikri - Cidade próxima a Agra. Lindo palácio! " Foto: Karina e Pablo
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    Em Fatehpur Sikri Agra." Foto: Karina e Pablo
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    Palácio construído há 500 anos e abandonado logo em seguida." Foto: Karina e Pablo
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    Karina em Agra" Foto: Karina e Pablo
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    Meditando" Foto: Karina e Pablo
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    Mais um lindo passeio" Foto: Karina e Pablo
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    Homem local fazendo salada de fruta" Foto: Karina e Pablo
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    Karina em Fatehpur Sikri - Agra." Foto: Karina e Pablo
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    Beijnho escondido (na India não pode dar beijo em público)... hehehe — em Fatehpur Sikri - Agra." Foto: Karina e Pablo
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    Linda construção e lindo jardim! — em Agra." Foto: Karina e Pablo
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    Ficamos impressionados com a beleza do lugar! — em Agra." Foto: Karina e Pablo
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    Uma construção mais bonita que a outra! — em Agra." Foto: Karina e Pablo
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    Um ângulo mais bonito que o outro" Foto: Karina e Pablo
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    Lindo jardim" Foto: Karina e Pablo
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    Taj Mahal ao fundo visto do Forte de Agra" Foto: Karina e Pablo
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    Feliz da vida!! " Foto: Karina e Pablo
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    O casal" Foto: Karina e Pablo
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    Karina e mais um palácio" Foto: Karina e Pablo
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    Os Saris colorindo a paisagem, sempre! — em Jaipur." Foto: Karina e Pablo
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    Palácio Jal Mahal. Um dos cartões postais de Jaipur" Foto: Karina e Pablo
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    Pablo em Jal Mahal, Jaipur, India." Foto: Karina e Pablo
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    Amber Fort. Outro lindo cartão postal." Foto: Karina e Pablo
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    A vista do palácio — em Amber Fort & Palace - Jaipur, India." Foto: Karina e Pablo
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    tas escadarias sempre! — em Amber Fort & Palace - Jaipur, India" Foto: Karina e Pablo
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    As pombas" Foto: Karina e Pablo
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    Detalhes do Palácio" Foto: Karina e Pablo
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    Tudo muito rico em detalhes... — em Amber Fort & Palace - Jaipur, India." Foto: Karina e Pablo
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    Macaco da cara preta." Foto: Karina e Pablo
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    A macaca" Foto: Karina e Pablo
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    Sorria!!!!!!!!!!" Foto: Karina e Pablo
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    Em Jaigarh Fort, Jaipur." Foto: Karina e Pablo
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    Linda vista do alto do Jaigarh Fort" Foto: Karina e Pablo
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    Uma bela luz" Foto: Karina e Pablo
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    Karina na torre" Foto: Karina e Pablo
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    A muralha" Foto: Karina e Pablo
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    Ficamos lá admirando a vista até o sol se pôr." Foto: Karina e Pablo
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    Se divertindo como sempre!! " Foto: Karina e Pablo
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    Pink City. Jaipur é conhecida como a Cidade Rosa." Foto: Karina e Pablo
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    Os vendedores estão por toda parte da cidade" Foto: Karina e Pablo
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    Camelos e elefantes são utilizados como transporte." Foto: Karina e Pablo
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    Muito engraçado vê-los por toda parte da cidade." Foto: Karina e Pablo
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    Muito dóceis! " Foto: Karina e Pablo
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    A linda e pacata Pushkar!" Foto: Karina e Pablo
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    Em Ranakpur Jain Temple." Foto: Karina e Pablo
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    Entramos no clima" Foto: Karina e Pablo
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    Em Pushkar, Rajasthan." Foto: Karina e Pablo
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    Lindo Templo Sikh" Foto: Karina e Pablo
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    Traje típico de um Sikh" Foto: Karina e Pablo
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    As flores estavam por todo lugar!" Foto: Karina e Pablo
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    Mais um pôr-do-sol" Foto: Karina e Pablo
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    Passeio de barco pela Veneza indiana. — em Udaipur." Foto: Karina e Pablo
 

Enquanto escrevemos este texto, nossos corações estão transbordando de alegria e emoção aqui em Rishikesh, um lugar muito especial, mas que será abordado em outro relato. De forma a não ficar longa e cansativa esta narrativa, sintetizaremos um longo trecho que nossa viagem, de Khajuraho ao Rajastão. Definitivamente, uma parte da viagem que nos remeteu a templos fascinantes, castelos suntuosos, lendas famosas, muralhas imensas e muitas histórias de guerra e amor.

Retomaremos ao ponto de onde estávamos em nosso último relato: Allahabad e o Kumbh Mela. Decidimos antecipar em dois dias nossa saída de Allahabad, de forma a evitar a multidão que se formaria nos dias seguintes, atraída pelo último banho real no Sangam (encontro dos rios sagrados) do Kumbh Mela. Mais tarde descobrimos que esta decisão fora precisamente acertada, não só por conta do tumulto que se formou nas estações de trem naqueles dias (inclusive ficamos sabendo de um acidente mortal), mas especialmente em razão das fortes chuvas que danificaram terrivelmente o acampamento e comprometeram as tendas onde estávamos.

A viagem de Allahabad para Khajuraho foi uma péssima experiência, a pior vivida até aqui. Acordamos na madrugada para pegar o trem de Allahabad com destino a Khajuraho, mas a “rickshaw” (bicicleta com dois acentos traseiros) que nos levaria até a estação ferroviária não apareceu. Sendo assim, não nos restava outra alternativa, senão caminhar até encontrar outra forma de transporte. Ao passarmos pelo posto policial, dois guardas que haviam presenciado a negociação com o condutor na noite anterior, rapidamente surgiram, questionando-nos a respeito do ocorrido. Indignados, ambos nos acompanharam até uma rua mais movimentada, onde barraram o trânsito no intuito de encontrar uma carona para os dois brazucas assustados. Não foi preciso muito tempo. Logo estávamos a caminho da estação de trem a bordo de um luxuoso carro, gratuitamente, na companhia de um simpático casal: Checher, advogado, e Sonia, professora e contadora de estórias, ambos muito amorosos e simpáticos.

Vivenciaríamos nossa primeira experiência nos famosos trens da Índia. A advertência de amigos era de que comprássemos tickets de primeira ou segunda classe, caso contrário, teríamos problemas. Qual foi nossa surpresa ao descobrirmos que o único trem disponível não tinha esta opção, apenas o tipo “passenger”. Sem saber o que isso significava, literalmente embarcamos neste trem. A estação estava cheia e muitos trens chegavam e partiam, não estávamos certos qual era nosso trem. Como sempre, os indianos são muito solícitos e nos ajudaram, mesmo aqueles que nada falavam em inglês, de alguma forma tentavam nos auxiliar.

Quando descobrimos qual era nosso trem, ele já estava prestes a sair. O apito soou e um outro indiano nos apressou a subir no primeiro vagão. O trem começou a andar e veio o desespero, especialmente porque eu e Karina não estávamos próximos um do outro. Com muita dificuldade, por conta das pesadas mochilas, subi nas escadas do vagão e gritei para Karina subir na escada mais a frente, a qual aparentemente também dava acesso ao mesmo vagão. Com temor de que ficaríamos em vagões diferentes e para meu desespero, Karina atrasou sua subida para pegar a mesma escada, momento em que o trem acelerou e ela quase ficou para trás. Ufa, que susto! Mal entramos no vagão e tivemos outra surpresa. Ele estava lotado e não havia assento vago. De fato, havia 5 a 6 indianos espremidos em assentos para 4 pessoas apertadas. Todos olhavam para nós, éramos os únicos gringos naquele vagão. Certamente para eles a cena era divertida. Foi quando um deles apontou para cima, ou seja, para o espaço onde são colocadas as malas. Sim, subimos sem hesitar no bagageiro e lá permanecemos por 7 horas. No início, pareceu-nos desconfortável e estranho, além de hilário, mas as horas se passaram tranquilamente, especialmente porque estávamos confortavelmente isolados do entra e sai de pessoas abaixo de nós.

Infelizmente, deveríamos parar na cidade de Mahoba e trocar de trem. Como o trem para Khajuraho partia muito tarde daquele dia, optamos por seguir de ônibus. Quanto arrependimento! Dica de ouro para quem vem para Índia: ônibus é terminantemente a última opção, os veículos são horríveis e as estradas pior ainda. Quando chegamos na suposta rodoviária, as pernas já tremeram diante daquele caco metálico que se intitulava ônibus. Evidentemente morreríamos de tétano. A Karina hesitou com razão e impôs como condição para embarcar um lugar para se sentar naquele veículo pré-histórico que já partia lotado. Esta condição foi retransmitida ao vendedor de passagens, o qual de pronto arrumou dois acentos, provavelmente desalojando alguém.

Estávamos e ainda estamos preparados para este tipo de situação, tanto que encaramos aquela lata velha, mas realmente na medida que o tempo passava, a situação só se agravava. O percurso entre as cidades de MAHOBA (como diria o Silvio Santos, hihi MAqueHOBAda) e Khajuraho era de apenas 90 quilômetros, portanto, imaginávamos que, por pior que fosse o meio de transporte, a experiência não seria tão longa. Porém, para nossa surpresa foram mais de 5 horas intermináveis de viagem.

Nossa estatura é mediana, mas excessiva para aqueles acentos. Sentamo-nos de lado para caber nossas pernas naquele cubículo, sendo que meus joelhos e pés ficaram no corredor, tomando pancadas e pisadas a todo tempo. Foram dezenas de paradas no caminho para ingresso de mais pessoas. Quando parecia inimaginável que qualquer alfinete entrasse no ônibus, subiam mais 6 pessoas e assim seguia. Elas ficavam agarradas na porta, metade do lado de fora. Isto se repetiu inúmeras vezes, a ponto das pessoas ficarem esmagadas entre si e debruçadas sobre aqueles que estavam sentados. Por mais absurdo que pareça, se não houvesse grade nas janelas, talvez alguém cairia para fora. Eu fiquei sem sentir as pernas da metade para o fim da viagem. Tentamos acolher as crianças, evitando que fossem espremidas ou quem sabe pisoteadas. No início, elas ficavam ressabiadas em sentar no colo daquelas pessoas tão diferentes, mas logo relaxavam, sob olhar atento e agradecido da mãe. Mal saia uma criança do meu colo, logo apareceria outra para ser amparada.

Chegar ao hotel naquele à noite foi um alívio e um prazer. O pesadelo rodoviário havia acabado e após uma semana de acampamento iríamos deitar sob a mesma cama em um quarto de hotel. Estávamos enfim numa cidade pequena e pacata. Tudo era próximo e acessível, inclusive a principal atração da cidade, um conjunto de templos medievais, situado a alguns metros do nosso hotel. O estilo de cidade, pequena e turística, encantou-nos. Decidimos tirar o dia seguinte para descansar antes de visitar os pontos turísticos. O centro da Kajuraho permanece a maior parte do tempo fechado para veículos, o que afasta o barulho infernal das buzinas e também se nota, para os padrões da Índia, um cuidado raro com a limpeza.

Nesta pequena cidade está um famoso grupo de monumentos listado pela UNESCO como “sítio cultural de valor excepcional para a humanidade”, ou seja, considerado um Patrimônio Mundial da Humanidade. Também é intitulada como uma das "sete maravilhas" da Índia. Esta obra espetacular foi construída entre os anos 950 e 1050 pela dinastia Chandela, a qual sobreviveu por cinco séculos antes de cair diante do ataque Mughal (depois explicaremos melhor a dinastia Mughal). Curioso que estas obras foram abandonas e tomadas pela selva, sendo redescobertas muitos séculos depois pelos ingleses no ano de 1838.

Os monumentos ficaram famosos não só pela riqueza de sua construção e conservação, mas também pelas imagens eróticas, a ponto de muitos os chamarem de templos do Kamasutra. A ideia inicial que tínhamos dos templos estava um pouco destorcida com estes estereótipos. A verdade é que apenas 10% das esculturas contêm temas sexuais. A maior parte das esculturas são de lindas divindades e representações do cotidiano dos povos daquela época, tais como músicos, animais, agricultores etc. Por outro lado, as poucas imagens sexuais chamam a atenção de todos os visitantes, demonstrando que em determinado momento histórico do hinduísmo havia grande simbiose entre religiosidade e sexo. Segundo a filosofia tântrica, o sexo era uma das práticas para se conectar com a divindade. Verdade seja dita, algumas esculturas mostram posições sexuais curiosas, um belo estímulo para imaginação. Enfim, o complexo de monumentos é realmente maravilhoso e digno de ser contemplado.

Sempre que nos deparamos com estas obras do homem, naturalmente somos instados a refletir a respeito da forma como viveram os homens e as mulheres daquela época e região. Quantas pessoas ali imprimiram seus esforços, energia e talvez suas vidas? Será que valeu a pena? Como elas viviam? Quais eram as dificuldades, sonhos, frustrações, buscas, incertezas, expectativas, prioridades, valores? Quão semelhantes ou diferentes eles são de nós? Esta manhã nós participamos de um Satsang (encontro com o guru) aqui em Rishikesh com o mestre Mooji*. Por muitas razões, foi um encontro muito marcante para nós, mas uma das coisas que ele falou se relaciona com estas indagações: “Quantas pessoas já caminharam sob este planeta? Onde elas estão agora? Para onde foram seus medos, conquistas, bens (...)? Estas coisas foram ou são importantes? (...)”. No contexto se falava do desapego, da transitoriedade entre muitos outros temas interessantes.

Nosso próximo destino era Agra e seu inconfundível Taj Mahal. Poucos foram os momentos em que nos sentimos ansiosos e cheios de expectativa em relação a um destino. Em geral, temos uma ideia de roteiro a seguir, mas nada previamente planejado ou pesquisado, de forma a permitir que as coisas fluam naturalmente, sem grandes expectativas. Mas nos pareceu impossível não se entusiasmar com a ideia de ver com nossos próprios olhos este belíssimo monumento, sobre o qual todos nós em algum momento já ouvimos falar, vimos fotos ou imagens. O Taj Mahal é amplamente e merecidamente reconhecido como a joia da arte muçulmana na Índia, admirada por quase todos que vem à Índia, além de também ser considerada Patrimônio Histórico da Humanidade. Estima-se que mais de 2 milhões de visitantes passam por lá a cada ano!

Esta imensa obra humana nos fascinou por dois aspectos. Primeiro, a construção em si, há nela um perfeito equilíbrio entre imponência e leveza. As linhas nos passam suavidade e as cores harmonia. É delicioso sentar em seus jardins e contemplar aquela obra por horas a fio. Nossa preferência pessoal são as belezas naturais, mas esta obra humana realmente é estupenda. Segundo aspecto, é a envolvente história que permeia sua construção. Invocamos aqui nosso Jorge Ben Jor para nos ajudar: “Foi a mais linda história de amor, que me contaram e agora eu vou contar, do amor do príncipe Shah Jahan pela princesa Mumtaz Mahal ...”.

Este incrível monumento é uma declaração de amor póstuma feita pelo imperador islâmico Shah-Jahan a sua terceira esposa, hinduísta, Mumtaz Mahal. Trata-se de um conjunto de construções no estilo persa e mughal, tendo como centro o imenso mausoléu de mármore branco construído em 1653, chamado Taj Mahal. Logo após a conclusão do Taj, Shah Jahan foi deposto por seu filho Aurangzeb e colocado sob prisão domiciliar no grandioso Forte de Agra, o qual também visitamos. Embora não estivesse em seus planos e projeto arquitetônico inicial, após a sua morte, Shah Jahan foi sepultado no mausoléu ao lado de sua esposa amada, cujo túmulo se tornou o único aspecto assimétrico daquela construção colossal. Sentamos em alguns dos bancos do jardim, hipnotizados pelo Taj, observando ele gradualmente se tornar dourado na medida em que o sol ia se pondo majestosamente.

A cidade de Agra em si não nos agradou, pelo contrário, tivemos uma má impressão dela, talvez porque não encontramos um bom hotel e acabamos nos rendendo à pior hospedagem que tivemos até aqui. Tirando o Taj e o Forte, pareceu-nos uma cidade sem charme ou outros atrativos, senão mais uma grande cidade com muita poluição para todos os sentidos. Também fizemos um “bate volta” na cidade ao lado para visitar Fatehpur Sikri. Esta cidade foi fundada em 1569 pelo famoso imperador Akbar e serviu de capital do Império Mughal. Foram necessários 15 anos, entre planejamento e obras, para edificar uma série de palácios reais, haréns, tribunais, aposentos particulares e uma enorme mesquita. Curiosamente, este complexo imperial foi abandonado logo após a sua conclusão, supostamente devido escassez de água na região.

Explicaremos um pouco mais o que foi o império Mughal, haja vista que sua influência se fez presente também em todas as cidades que visitamos nas semanas seguintes. O Império Mughal governou todo o subcontinente indiano por séculos. Os seus imperadores eram muçulmanos, com forte influência persa e descendentes diretos de Genghis Khan (grande conquistador mongol, que muitos séculos antes formaram o maior império já visto). Os Mughals marcaram um período de progresso cultural-econômico, de harmonia religiosa, guerras expansionistas e de construções de monumentos magníficos, dentre eles o Taj Mahal.

O império Mughal reinou por alguns séculos e só foi subjugado pela coroa inglesa, a qual por sua vez dominou a Índia até a sua independência em 1947, quando o país foi divido em dois, criando-se dois novos países independentes: Índia e Paquistão. Este período de independência da Índia também é fascinante, pois coincide com a retirada da Inglaterra, fim dos Marajás e Califas, do grande conflito religioso entre Hindus, Mulçumano e Sikhs, mas especialmente pela influência de Mahatma Ghandi. Mas isto é outra história e quem tiver curiosidade vale a pena se aprofundar nela.

Nossa próxima parada foi a grande cidade de Jaipur, capital do imenso estado do Rajastão. As opiniões em relação a esta cidade eram contraditórias, alguns nos sugeririam ignorá-la, outros a apontavam como parada obrigatória. Decidimos pagar para ver, afinal, Jaipur faz parte do famoso “triângulo de ouro”, ao lado de Nova Delhi e Agra. Chegamos na madrugada e tivemos a felicidade de nos hospedar num hotel muito bom e barato, com charmoso restaurante no seu terraço. Por estas razões ficamos em Jaipur mais tempo que o necessário, também para recarregar as baterias. Temos nos fartado na comida por aqui, mas deixaremos para relatar este tema em outra oportunidade.

Jaipur é uma cidade grande, com mais de 3,5 milhões de habitantes e de clima semi-árido, marcando o início do deserto do Rajastão, uma região fascinante. A cidade foi originalmente construída dentro de muralhas e planejada de acordo com a arquitetura védica indiana, visando o conforto e a prosperidade de seus cidadãos. Ela também é economicamente famosa pela exportação de ouro, diamante e jóias. Percebemos a existência de uma forte indústria artesanal, onde a maior parte dos turistas se deliciam em compras. Todos tentavam nos arrastar para o famoso bairro de artesanato, mas nossas pesadas mochilas nos impedem de adquirir qualquer item novo, pelo contrário, gradualmente estamos nos desfazendo de alguns itens com vistas a chegar em nossa meta, reduzir 35% da nossa bagagem.

Contratamos um simpático motorista de tuk-tuk (moto com cabine traseira para duas pessoas) chamado Ali para nos levar nos principais pontos turísticos da Jaipur. O simpático e sorridente Ali era muçulmano e pai orgulho de dois filhos. No dia que fomos fazer o tour pela cidade os tuk-tuks estavam promovendo uma paralisação geral, especialmente no centro da cidade. Quando perguntei porque ele não tinha aderido à greve, ele me respondeu com uma expressão mais ou menos assim: “o estômago não faz greve”, no sentido de que um dia sem trabalhar impactaria no sustento familiar. Desta forma, nosso passeio teria que evitar o centro, obrigando-nos a rodear a “cidade rosa”, como é conhecida. Entretanto, quando estávamos próximos de nosso primeiro ponto de visita, uma barreira de grevistas obrigou Ali a parar seu veículo, iniciando-se um momento tenso. O tuk-tuk foi rodeado por grevistas nervosos. A Karina ficou apreensiva e sugeriu que partíssemos à pé, como queriam os manifestantes, mas eu tentava ajudar o motorista explicando que a contratação acontecera antes da greve. Após muita discussão, nosso tuk-tuk foi liberado, porém recairia futuramente sob ele uma pesada multa sindical.

Em Jaipur visitamos o templo dos macacos, o qual deveria ser chamar templo do zoológico, pois além da “macacada reunida”, cruzamos também, no caminho do singelo templo situado no alto de uma montanha, com cabras, vacas, porcos, corvos, pombos, entre outros animais. Em seguida, visitamos uma região repleta de elefantes, onde pudemos acariciá-los enquanto se alimentam. Contudo, o ponto mágico foi a visita ao conjunto fortes e palácios chamados de Amber e Jaigarh Fort. No primeiro (Amber Fort) há um palácio pomposo onde viveram muitos Marajás e sua corte. Os Marajás (também denominados Sultões ou Nababos, se muçulmanos) foram figuras notáveis, equiparados a reis que governavam regiões diversas da Índia. Na véspera da sua independência, a Índia (incluindo os atuais países Paquistão e Bangladesh) continha mais de 600 estados principescos, cada um com suas próprias regras. O império britânico governava diretamente dois terços da Índia, o resto estava sob administração indireta dos Marajás.

Já o Jaigahr Fort fica logo atrás do Amber Fort, porém no alto de uma colina. Subir a montanha foi uma diversão, pois além da atividade física, divertimo-nos com os macacos de cara preta, muito diferentes daqueles que estávamos acostumados até então. As portas dos fortes chamaram nossa atenção, com pontas de metal maciço na parte superior. A explicação era de que elas serviam para inibir o ataque de elefantes, animal largamente utilizado nas guerras e muitas vezes determinante para vitória, como constatou Alexandre O Grande em suas batalhas pelo Subcontinente indiano. Permanecemos neste forte, no alto desta incrível montanha até o seu fechamento, curtindo sem pressa o pôr do sol maravilhoso no deserto, enquanto Ali nos esperava pacientemente.

Alguns dias de descanso e passeio foram suficientes para novamente cairmos na estrada, ou melhor, nos trilhos da Índia, agora seguindo para Pushkar, cidade sagrada e palco de grandes peregrinações. De acordo com a mitologia indiana, quando a esposa do Deus Shiva morreu, Sati, ele chorou tanto e por tanto tempo que suas lágrimas criaram duas lagoas, uma delas em Pushkar. Esta cidade é um dos cinco dhams sagrados (local de peregrinação) para devotos hindus e uma das mais antigas da Índia, cuja origem é desconhecida, mas as lendas associam sua criação ao Deus Brahma. Tivemos bons momentos nesta simpática e mística cidade. Sentimos a paz e as orações do Ghats. A Karina ficou fascinada pelas feiras repletas de roupas, joias, bijuterias e livrarias, mas teve que se conter e apenas desfrutar do passeio pelas lojas. Imagine como ficariam nossas mochilas após 500 dias se comprássemos uma recordação de cada destino.

Foi em Pushkar que pela primeira vez entramos em contato com a religião Sikh. Ingressamos num lindo templo todo branco, visitamos seu interior e ganhamos um folheto explicativo da doutrina. Pareceu-nos muito interessantes seus princípios, os quais deixaremos para explicar no próximo relato, quando abordaremos nossa visita à capital religiosa dos Sikhs, Amritsar. Subitamente, enquanto liamos o folheto, fomos abordados por uma figura enigmática, com seus enormes bigodes, turbante característico, vestimenta casta e apetrechos metálicos, com colar, pulseiras e punhal. Ele insistia em falar numa língua estranha que posteriormente descobrimos, por intermédio de outra pessoa que de nós se aproximou, que era o idioma punjab, o qual era falado no estado de mesmo nome. A despeito da imagem austera deste personagem, ele se demostrou muito amigável. Saímos deste templo com uma ótima impressão deste até então desconhecido culto.

Certa noite, acordei assustado pois senti a cama tremer e as portas rangerem, certo que de se tratava de um terremoto. Saltei da cama, mas não acordei a Karina para não assustá-la. Corri para sacada do hotel tentar entender o que estava acontecendo. Não vi nada de anormal, apenas o sol nascendo lentamente. Sai do quarto e vi uma senhora varrendo o chão calmamente. Achei tudo muito estranho e corri para internet buscar informações. Percorri vários noticiários indianos e nada encontrei. Algumas horas depois a Karina acordou e lhe relatei o ocorrido. Ela sorriu, disse-me que eu tinha sonhado tudo aquilo e assim acabou esta história, deixando-me com uma pulga atrás da orelha.

Nossa despedida de Pushkar foi brindada com mais um pôr do sol mágico, no alto de uma montanha, de onde avistamos o espaço onde é realizada a lendária feira de animais, incluindo 50 mil camelos vindos de todas as partes. Partimos novamente de trem para Johpur, chamada de "Cidade Azul". Sim, os nomes são semelhantes, pois “pur” significa “cidade”. Embora fosse meu aniversário, tínhamos que seguir em diante e deixamos para comemorar à noite. Hospedamo-nos em um hotel de melhor nível, onde desfrutamos de um romântico jantar no terraço, com uma linda visão panorâmica do maior atrativo desta cidade, o Forte Mehrangarh. Comemoramos meu aniversário com aquele visual incrível, com direito a comemoração familiar via skype, carinhosamente planejado pela Karina.

Jodhpur era antigamente a sede de um estado principesco conhecido como Marwar, popular destino turístico, com muitos palácios, fortalezas e templos, situado na paisagem austero do deserto de Thar, em direção ao Paquistão.

Estas cidades do Rajastão são fascinantes! A arquitetura, a comida, o clima, as roupas, os castelos, os saris, as muralhas, os turbantes, a barba, as danças, artesanato, os enormes bigodes, os sapatos de Aladim, os narguilés, a música, as cores, e tanta outras coisas, fazem do Rajastão um universo a parte dentro da Índia. Como se mergulhássemos nas estórias das Mil e Uma Noites. O principal castelo de Johdpur é enorme e lindo. Acabei conversando com o senhor local, uma figura de barba e bigode enormes, o qual me relatou acerca dos poderes sexuais do ópio. Rimos muito juntos. Sim, o consumo do ópio faz parte da cultura rajastane e ainda é apreciado nos dias de hoje.

Nosso último destino no Rajastão foi a linda cidade de Udaipur, considerada a Veneza do Oriente, pois está cercada de lindos lagos e canais. Uma das cidades mais ricas da Índia, Udaipur nos pareceu mais organizada, limpa e charmosa. Nosso hotel tinha uma excelente visão do lago Pichola, onde há dois palácios, um deles totalmente feito de mármore. Além do excelente restaurante no terraço do hotel, também havia sessão diária de cinema. Um dos filmes que o proprietário do hotel se orgulhava era um antigo filme da saga James Bond, “Octopussy”, haja vista que boa parte dele foi filmado em Udaipur em 1983.

Dentre os vários palácios e museus na região, fomos visitar o City Palace, um lindo e bem conservado palácio, construído e administrado até os dias de hoje pelos Mewars, dinastia considerada uma das mais antigas do mundo. Há uma lenda que o marajá Maharana Udai Singh II encontrou um Sadhu durante uma caça, o qual abençoou o rei e lhe pediu para construir um palácio naquele local, assegurando-lhe que iria ser bem protegido. Lenda ou não, Udaipur foi um dos únicos locais que jamais sucumbiram diante das investidas do Mughals.

Como nos restava algum tempo antes de nossa viagem para o norte da Índia, decidimos fazer uma curta viagem até uma região próxima chamada Ranakpur, lar do mais importante templo Jainista. O jainismo é uma das religiões mais antigas da Índia, juntamente com o hinduísmo e o budismo. Os seus adeptos devem combater as paixões de modo a alcançar a libertação do mundo, assumindo postura ascética e a prática da doutrina da não-violência. Construído a mais de 500 anos, este templo de puro mármore, contendo mais de 1400 pilares. Mais um obra magnífica do homem, um espaço místico que nos transmitiu profunda paz.

Vivemos bons momentos nesta agradável cidade. Ficou gravado em nossas mentes e corações a cidade de Udaipur vista do cume de uma montanha próxima, conhecida como “sunset point” (mirante – pôr do sol). Vem se tornando um hábito assistirmos o pôr do sol. Engraçado como o conceito e importância deste momento do dia está sendo alterado ao longo da viagem. Em nossa rotina, o pôr do sol era um simples transição entre o dia e a noite. Agora se tornou um momento mágico do dia, merecedor de nossa atenção, contemplação e emoção.

“Se eu pudesse viver novamente minha (...)
Correria mais riscos, viajaria mais,
Contemplaria mais entardeceres,
Subiria mais montanhas, nadaria mais rios (...)
Mas, já viram, tenho 85 anos e sei que estou morrendo”.

__ Don Herold


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