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Mãe e filha descobrindo o Deserto do Atacama
 
da Redação: Elias Luiz
29 de maio de 2015 - 9:50
 

Quézia Cunha, a mãe, e Maria Luíza, a filha, descobrindo novas culturas, culinárias, belezas naturais e sentimentos no Deserto de Atacama. Na foto, o Deserto de Tara.
 

“Estamos atravessando a Cordilheira dos Andes!” Com essa declaração do comandante do avião sentimos pela primeira vez a emoção de estar numa das maiores cadeias de montanhas do mundo! E nesse dia, elas estavam douradas pela luz do por do sol que em tons de laranja, rosa e lilás nos saudavam com magia e estonteante beleza. O primeiro dos cenários que se descortinariam para nós, ansiosas por conhecer o Deserto do Atacama, eu, Quésia Cunha, aventureira acostumada a viajar sozinha ou com amigos por montanhas e muitas trilhas desafiadoras, e mãe da Maria Luíza!

“E eu, Maria Luíza, estudante de engenharia e principiante em viagens de aventura, tive uma experiência mais que especial no deserto. Pode-se dizer que um foi um autodescobrimento, o aparecimento de uma paixão adormecida por liberdade, uma inspiração inebriante que vou levar pelo resto da vida de um primeiro contato com o sentimento de se sentir infinita só de estar inserida em paisagens como as que vi e que senti ao lado da minha mãe."Maria Luíza

Estar no deserto mais seco e mais alto do mundo é uma experiência surpreendente! Seja pela beleza exótica que enche os olhos de cor e imagens das mais diversas, seja pela constatação da capacidade do ser humano em encontrar e identificar os oásis que reserva até o mais árido cenário do mundo. O Deserto do Atacama está localizado no Norte do Chile e em alguns lugares não chove há centenas de anos. Ele é centenas de vezes mais seco que o deserto do Saara e ainda assim, ou exatamente por essa razão, é um lugar espetacular e inesquecível.

O pequeno vilarejo de San Pedro de Atacama é o centro mais movimentado e povoado do deserto. Devido ao vai e vem dos turistas que incorporados ao lugar se confundem e se destacam transformando o lugarejo em uma babel de gente, que de tão diferentes parecem iguais.

O lugar tem uma lógica muito própria com suas ruas simples com construções de adobe que servem como ponto de apoio às milhares de pessoas que chegam e por seus muitos hostess, restaurantes, lojas de artesanato e agências de guias especializados nos muitos passeios organizados para a região.

     
     

Valle de la Luna

O Valle de La Luna é um passeio tradicional e imperdível para quem se aventura no Atacama. Ele é planejado para começar em torno das 16h, evitando o horário do sol escaldante e típico do deserto. Ao final do passeio fomos brindadas com um por do sol que estonteia os olhos com a explosão de cores a espalhar-se pelo céu. É uma recordação que tem valor de tesouro!

Haviam nos dito que esse passeio era bem simples, mas, para nossa surpresa, foi lindo e apaixonante com cenários de exuberância inigualável. O Valle de la Luna fica bem próximo de San Pedro, assim como o Valle da Muerte. Toda vastidão de dunas e rochas avermelhadas nos dá a sensação de realmente estar em outro planeta com as rochas esculpidas pelos ventos que deram formas criativas e belas.

Depois de andarmos pela sequidão do deserto e pelas imensas formações arenosas, subir na duna que parece se mover com o vento, onde é possível vislumbrar a imensidão e encantamento do local, fez nosso coração literalmente acelerar mais ainda.

A vista e o silêncio que imperam no local emocionam de forma muito especial. É inacreditável a beleza da Cordilheira de La Sal e Cordilheira de Los Andes e seus vulcões que se destacam na imensidão.

As cuevas de sal são percursos pelas rochas que proporcionam experiências bacanas de se viver no Valle. Uma imensa montanha de sal com curvas sinuosas que formam um labirinto escuro e apertado e todo de sal que nos dá a dimensão da grandiosidade da natureza e da nossa consequente pequenez diante dela.

Ao final do dia, com a temperatura dos ventos mudando, as cores começam a mudar o cenário e pintar o deserto em tons avermelhados, roxos e cinza. Uma imensidão de cores cobre o céu abraçando o deserto e quebrando a dureza do calor que cede à presença do frio do anoitecer. Faz calor mas, também muito frio no deserto!

Tour arqueológico, Laguna Cejar e Salar Tebinquinche

Um belo passeio que fizemos foi o tour arqueológico pelos arredores de San Pedro. Percorrer de bike os três quilômetros até Pukara de Quitor é bem fácil quando se está aclimatado. A fortaleza foi construída na encosta da montanha e servia de domicílio e proteção para o povoado. Uma vista belíssima e um mirante cheio de histórias de bravura que nos fez reverenciar esse povo guerreiro e sempre ameaçado.

Conhecemos a Laguna Cejar, uma lagoa muitíssimo salgada que nos fez flutuar com muita facilidade. Ela tem um tom verde esmeralda e cercada por cristais de sal nos proporciona sensações maravilhosas. Nunca foi tão fácil flutuar e estar na lagoa mais salgada que o mar morto, é realmente impressionante e divertido. Ao sair da água, o sal seca rapidamente no corpo e é preciso retirá-lo com água doce, do contrário, você parecerá um empanado vivo!

As águas mornas com ventos frios, unida à sensação de viver momentos únicos em sua vida faz com que tudo valha à pena, qualquer esforço ou dificuldade que se tenha passado antes de chegar nesse paraíso desértico. Que privilégio viver esses momentos para nós, juntas a descobrir tantos oásis no deserto.

Salar de Atacama, Piedras Rojas, Lagoas Miscanti e Meñiques

Escolhemos o passeio pelas Lagunas Altiplanicas e com 4.100 metros de altitude e toda a vastidão do deserto a encher-nos de luz e cor. Ficamos deslumbradas com todo o surpreendente e majestoso cenário. O Salar de Atacama é uma planície com quase 100 km de extensão e com muito sal e belíssimas lagoas repletas de flamingos com suas pernas e bicos compridos, tão majestosos e lindos que parecem esculturas. Antes de chegar ao Salar passamos por uma pequena vila de Toconao, construída em pedra vulcânica e com uma charmosa igreja que é patrimônio histórico da humanidade.

Chegar em Piedra Hojas foi uma emoção indescritível. As pedras cobriam quase que a totalidade do chão do local e essas eram de um tom avermelhado que dava ao cenário uma beleza singular. Um lago calmo refletia as montanhas de uma forma tão bela que dava vontade de chorar e eu e Maria Luíza, na cumplicidade do deserto, absorvermos a magia do deserto que nos surpreendia a todo instante.

As lagoas Miscanti e Meñiques são divinas e de tamanha beleza que prendemos a respiração de tão emocionadas. Nenhum registro é capaz de expressar a sensação que é observar todos esses lugares. Pelo que entendemos as lagoas são formadas a partir de águas subterrâneas e em função da presença dos sais minerais assume a cor azul que se destaca e se harmoniza com o céu. O lugar é um importante e protegido berço de reprodução da Tagua Cornuda (ave chilena). Aliás, percebe-se o cuidado dos guias com a preservação do ambiente, outrora explorado de forma irresponsável e que pôs em ameaça a riqueza da fauna e flora.

     
     

Salar de Tara

Um dos mais interessantes e emocionante passeios foi conhecer o Salar de Tara. Depois de um saboroso café da manhã a 4.100 metros de altitude com vistas a uma laguna com elegantes flamingos indiferentes à nossa presença, chegamos a 4.800 metros de altitude e nos deparamos com rochas erodidas pelos ventos, totalmente intemperizadas, que são conhecidas como monges, e, de fato, quando olhadas ao longe pareciam guardiãs do deserto.

Depois de percorrermos uma estrada de pedregulhos chegamos a um imenso paredão de rochas torneadas pelos ventos que leva o sugestivo nome de catedral. Somos deixadas ali pelo guia que segue mais ou menos uns cem metros para preparar o almoço. Ficar aos pés da catedral nos faz reverenciar toda imponência digna das construções góticas, barrocas ou renascentistas. A diferença é que ali o homem não colocou sua mão para produzir beleza. Em função da fragilidade e exposição do local, as visitas custam caro e são bastante controladas pelo governo local. Almoçamos um saboroso banquete, sentadas defronte para a lagoa, contemplando aquele santuário. Estávamos cheias de paz e com o coração transbordando de gratidão.

Geisers del Tatio

O passeio começa às 4h da manhã e com muito frio e muitas camadas de roupas para proteger do vento cortante e gelado, chegamos à base do Vulcão Tatio, um campo de gêiseres que é considerado um dos fenômenos mais importante do mundo. Contemplar sua manifestação quando o sol está nascendo é, sem dúvida, uma emoção ímpar! Em função da mudança da temperatura, brota água, fumaça e larvas ferventes em direção ao céu. A pressão no interior da terra expele até 10 metros de altura a água que corre do rio subterrâneo com temperaturas que podem chegar a impensáveis 80ºC.

As águas quentes e vulcânicas são canalizadas para uma piscina natural que Maria Luíza, esbaldou-se em contraposição a um vento frio que eu não quis enfrentar.

O Deserto de Atacama tem ainda uma vista eterna e impressionante do Vulcão Lincancabur. Tem a charmosa e histórica igreja de San Pedro, que nessa ocasião estava em reforma mas, ainda assim, uma constatação de beleza e riqueza cultural. Tem a deliciosa carne de llama. Tem também as Termas de Puritama que ficam em um vale recortado por um rio de águas quentes originárias da base dos vulcões com várias piscinas naturais onde pudemos tomar banho em águas tão transparentes que pareciam vidro líquido.

San Pedro tem artesanato bem típico, poeira, calor e frio, restaurantes maravilhosos, povo simpático e um aconchego que nos fez sofrer só de pensarmos que chegaria o momento de irmos embora daquele lugar!

Minha primeira viagem com minha filha foi uma experiência de amor e cumplicidade. Acho que a melhor parte da herança que posso transmitir: respeito e amor pela natureza e sua diversidade. Comprovar o quanto podemos estar saciados com pouca comida e olhos fartos de beleza. Felizes em carregarmos tudo o que necessitamos em uma mochila cargueira. Vivenciar junto o quanto a simplicidade é um luxo refinado. Que ao caminhar, vamos encontrar amigos de infância que nem sabia que tínhamos e sentir o coração se dispor a abrigar novos sorrisos e novas histórias. Perceber que quanto mais nos afastamos de coisas, nos reencontramos inteiros e autênticos. Sem dúvida, a natureza, é nossa grande mestra, nossa nobre mãe.

“Eu aprendi na minha primeira expedição com minha mãe que viajar e conhecer outros lugares, culturas, costumes e pessoas é necessário. Necessário porque assim crescemos como pessoas, renovamos a energia da melhor forma que é em contato com a natureza. Vivenciamos uma nova história a cada dia de expedição, e carregamos um pouco de cada novo amigo que conhecemos ao longo da viagem. Foi especialmente marcante para mim, porquanto, foi um claro despertar para vida, um despertar para tudo o que ainda tenho para conhecer no mundo, um despertar para o que realmente é essencial à vida. Hoje me sinto diferente e eternamente grata a minha mãe que me apresentou essa nova perspectiva da vida. É preciso viver, É preciso viajar!"Maria Luíza,
a filha

Quésia Cunha,
a mãe

 
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