Diferentes espectadores dariam as mais diferentes definições sobre uma grande aventura.
Temos acompanhado diversos aventureiros fazendo coisas maravilhosas, atravessando o mundo de bicicleta, mochileiros eternos, viagens com menos de 1 dólar por dia, o escalador que sobe nu e sem nenhuma segurança, o nadador que atravessa o pacífico solitário, o remador de 100 dias entre céu e mar, o mesmo remador que resolve passar um ano com seu barco congelado. Tantas aventuras, tantas coisas diferentes, tantos Everest.
E qual é o nosso Everest?
Li há mais de 10 anos um livro que me remetia a essa reflexão: não só o cume do Everest interessa para o aventureiro. Além de cada um ter seu próprio Everest, cada um tem sua grande aventura. Viajar o mundo já é uma grande aventura, desde a descoberta do caminho, do planejamento da rota, do mapeamento das dificuldades. E não precisa ser uma viagem ao redor do mundo. O que envolve essa viagem e o que essa viagem significa para cada um é o que transforma uma pequena travessia em algo grandioso.
É com esse sentimento que decidimos desbravar parte do continente africano. Nossa grande aventura é criar a própria aventura na descoberta do resultado de grandes interações entre o homem viajante e o homem local. Aliás, o nome Pés Livres, surgiu dessa vontade de interagir ao máximo com o ambiente que estamos inseridos. Se viajamos e não fazemos reservas de hotel, de passeios e de detalhes, a viagem já se torna uma grande aventura. A interação com as pessoas locais se torna uma experiência adicional e extremamente rica. Conhecemos pessoas diferentes, oportunidades aparecem, coisas que nenhum guia de viagem explica começam a acontecer. E essas experiências se tornam histórias que nunca mais esqueceremos e não ficam registradas em nenhum álbum de fotografias.
Nossa grande aventura não é tão grande aos olhos da maioria. Mas precisamos olhar com olhos atentos para ver a beleza de se aventurar por um continente pouco explorado e interagir de uma forma diferente com as crianças locais. É bem verdade que sabemos bem pouco de lá. Não sabemos o que iremos comer, onde iremos dormir, como são as estradas e como as pessoas nos receberão. Isto já é uma aventura, talvez.
Mas você consegue imaginar como seriam recebidas duas pessoas com as faces pintadas de palhaços? Talvez seja estranho né? Hoje quando vemos pessoas assim em um sinal de trânsito, pensamos que são vagabundos andarilhos pedindo dinheiro. Não queremos isso, é claro. E não somos assim.
“...as bicicletas abrem portas...”
Mas uma coisa nos diferencia muito disso. Ouvimos recentemente que as bicicletas abrem portas, que uma pessoa chegando em uma cidade andando é um vagabundo, mas uma pessoa chegando de bicicleta é um cicloturista, um aventureiro. É isso que queremos, sermos considerados exatamente da forma que somos, cicloturistas aventureiros.
E uma criança consegue resistir a um sorriso de um palhaço? Que aventura real é esta? Ver um sorriso sincero se abrir para nós em cada chegada será o combustível para nosso espírito, que muitos chamam de louco, outros chamam de aventureiro e nós chamamos de espíritos livres.
Nossa aventura será então assim, viajar de bike pela Tanzânia depois de subir o Kilimanjaro a pé. Mas achamos que isso não será o mais importante. A real grande aventura será o que levaremos em nossos corações através das pedaladas do nosso caminho e o que receberemos como retribuição por tentar dar amor a quem pode ter pouco. O que traremos em nossos corações da África será a nossa grande aventura.
Rafael Eustachio
Pés Livres |