ANDRÉ DIB
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Uma aventura pela cerrado brasileiro
 
 
02/06/2009 - 09h31 - Matéria publicada na Revista Aventura & Ação n° 151
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  Jardim de Maytrea
Foto: André Dib
   
 
  Poço Sereno - Complexo de Cachoeiras Macaquinhos
Foto: André Dib
   
 
  Tucano
Foto: André Dib
   
 
  Cachoeira Santa Bárbara - Cavalcante / GO
Foto: André Dib
   
   
 
 
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A Chapada dos Veadeiros, em sua face mais conhecida, é uma terra mística de paisagens surpreendentes. Elevando-se em pleno planalto central, no coração do Brasil, é formada por uma grande área de cerrado de altitude, farto de águas e nascentes de uma pureza ímpar. Abriga uma grande biodiversidade protegida com a criação do parque nacional em 1961, que resguarda 65.514ha compostos por uma natureza exuberante. Entre a rica fauna da região encontram-se Tamanduás, Lobo-Guará, Veado Campeiro entre outros. Algumas espécies, no entanto, correm um grande risco de desaparecer, como a Onça Pintada, que tem sua pele ostentada como troféu, além de ser caçada insistentemente por pecuaristas que contribuem com o declínio gradativo da espécie. São 312 aves catalogadas, entre elas, emas, araras e o Urubu-rei, caracterizado pela coloração exuberante, também é cada vez mais raro de se encontrar.  A vegetação é composta basicamente pelo cerrado em suas diferentes formas, como campos de altitude, cerrado rupestre e campos limpos entrecortados por veredas compondo verdadeiros cartões postais. São mais de 1400 espécies de plantas. Estima-se, no entanto, que cerca de 50 estão sob risco de extinção. Além da farta fauna e flora, a formação geológica é uma das mais antigas da América do Sul, composta por rochas de mais de 1 bilhão de anos compondo um grande patrimônio natural mundial, tombado pela UNESCO em 2001.  Obviamente, a riqueza natural não se restringe somente aos limites do parque, que expõem-se soberana por muitas léguas a perder de vista, e atrai ecoturistas e amantes da natureza em busca de uma boa caminhada, de um banho de cachoeira ou de uma contato mais íntimo com a natureza e com o próprio ser. 

O misticismo em perfeita harmonia com a natureza.

Alto Paraíso, cidade com cerca de 7000 habitantes, é procurada há muito por grupos esotéricos que crêem vivenciarem nesse lugar uma energia diferenciada. Pudera, essa essência mística é perfeitamente plausível e digna de um paraíso cercado por serras, rios e cachoeiras compondo uma natureza pulsante e transbordando de vida. Como se não bastasse a cidade fica sobre uma imensa placa de cristal de quartzo, alimentando essa atmosfera mágica. É impossível passar por ali sem sentir tal presença. Seja nas histórias fantásticas de seres de outro mundo, ou na simples ruptura com um mundo egoísta e voltado para o consumo. Seja nas práticas de terapias alternativas ou no fato de que a cidade está sobre a linha do paralelo14, mesmo marco que trespassa a cidade sagrada de Machu Picchu.  Segundo a NASA, é a área com maior luminosidade do planeta vista do espaço, devido a quantidade de cristal que brota da terra. Certos mistérios da natureza parecem impenetráveis e muitas vezes é melhor deixá-los assim. É claro que nem só de misticismo sobrevive a auspiciosa cidade goiana. Inúmeras trilhas levam a cachoeiras, cânions, e rios de água cristalina.  Para quem quer se aventurar existem diversas opções de esporte ao ar livre que são realizadas por ali. A agência Travessia Ecoturismo, especializada em turismo de aventura promove atividades como tirolesa, canionismo, trekking de diversos níveis e até travessias de 3 a 6 dias de duração, levando o viajante a lugares inóspitos e de rara beleza. Com guias experientes e a utilização de técnicas e equipamentos internacionalmente aceitos, as operações seguem as recomendações das normas brasileiras de turismo de aventura (ABNT), sendo referência no país. A tirolesa do “Vôo do Gavião” é um exemplo dessas atividades.  Com 850 metros de extensão, as pessoas podem desfrutar de toda a paisagem ao redor, conhecendo um pouco mais sobre a geografia da região. Seguindo de Alto Paraíso para a Vila de São Jorge, encontramos diversas cachoeiras convidando o viajante para um deleite em deliciosos poços de águas cristalinas. Entrando pela fazenda São Bento, a 8km de Alto Paraíso, caminha-se cerca de 1,5km para desfrutar de uma queda de cerca de 40 metros, conhecida por Almécegas. No mesmo sentido e mais perto da vila de São Jorge, encontramos o Vale da Lua. Trata-se de uma paisagem extravagante, formada por sulcos circulares nas rochas, que lembram as formas das crateras lunares, esculpidas lentamente pelo Rio São Miguel, compondo um ambiente raro e surrealista.

 São Jorge, a antiga vila de garimpeiros, abriga o portal de entrada do Parque nacional, que permite a visitação de um pequeno trecho de sua área, dividido em duas trilhas. Na primeira, visita-se o Salto de 120 metros, formado por duas quedas paralelas, que despencam a um cânion fendido pelo rio Preto. Um pouco mais acima, o visitante pode desfrutar de um banho num grande poço formado por uma queda de 80 metros. Na outra trilha, caminha-se por um longo terreno pedregoso e plano, chegando a dois cânions formados pelo mesmo rio. Depois visita-se uma ampla cascata chamada de Cachoeira das Cariocas. Na portaria do parque, o visitante conta com alguma infra-instrutura. Possui amplos banheiros, e um centro de visitação. Para o acesso as trilhas é necessário o acompanhamento de guias credenciados, ingressando entre 8:00h e 12:00h. O parque não abre as segundas feiras.  

Cavalcante preserva a história da Chapada e a memória de um tempo farto pelo ouro

Decorada por remanescentes casinhas em estilo colonial, Cavalcante é o marco histórico da chapada. Por volta de 1600, os Bandeirantes abriram as primeiras trilhas na região, no entanto sua fundação é datada de 1740, a cidade surgiu com a mineração. A febre do ouro trouxe centenas de pessoas em busca de tempos melhores, vindos de diversas partes do país, ocupando e povoando aquele lugar longínquo. Situada no flanco norte do parque nacional, abriga 65% de sua área total, a cidade é cercada por grandes paredões de pedra, que se mostram imponentes e guardam marcas de uma história recente, escrita com sangue de conflitos étnicos. Mais de 100 cachoeiras compõem aquele mundão de cerrado farto de água. Cortada por trilhas centenárias, o município possui incomensurável riqueza natural, que serve como cenário perfeito para práticas de esporte ao ar livre. A agência Suçuarana se organiza em roteiros exclusivos e investe no turismo responsável, focando a sustentabilidade da região em parceria com as comunidades locais. Esse turismo é baseado em algumas regras, como atividades socialmente justas, com uma séria preocupação ambiental e economicamente positiva para o destino. Uma trilha fascinante é a da ponte de pedra, curiosa composição rochosa formando um arco de 30 metros sobre o rio São Domingos, que desliza em uma garganta saltando por mais de 100 metros e escorrendo pelos paredões do parque nacional. Segundo Clayton, proprietário da agência Suçuarana, a trilha é a primeira certificada pela ABNT, e segue todas as especificações da ABETA (Associação brasileira de esporte e turismo de aventura). 

O isolamento geográfico preservou a cultura do povo Calunga

Cavalcanti é considerado como o berço dos povos da chapada. Abriga um dos principais quilombos brasileiro, há mais de 250 anos - Os Calungas - Hoje esses remanescentes se espalham por uma imensa área com cerca de 250 mil hectares. O povoado do Engenho II, mais próximo da cidade. E o Vão de Almas e Vão do Moleque que nos remete a um encontro com um passado recente. O isolamento ao meio de uma natureza rude, que segrega ainda mais seus habitantes, faz com que eles vivam como a séculos atrás, muitas vezes  em estado precário, precisando caminhar cerca de 5 km para pegar água, ou ficando isolados por meses sem ter acesso a um hospital. Chegaram ali, fugindo da escravidão e se isolaram entre os vales e afluentes do rio Paraná, em lugares quase inacessíveis. Ingressando nesses “Vãos”, como são chamados, entramos definitivamente em outra dimensão. 
Os Calungas são pessoas simples, profundas, que preservam hábitos que se impõem ao nosso tempo e que eleva o homem acima dos conceitos do consumo e da pasteurização que o mundo globalizado nos deixa de herança, suprimindo a cultura popular e a sutileza encontrada na simplicidade das coisas. Apesar de estarem desprovidos de bens materiais, sabem aproveitar a vida melhor do que nós da cidade. Isso fica evidente na alegria das crianças brincando no rio, ou na serenidade estampada no rosto dos mais velhos.

Turismo Solidário, uma nova forma de integração dos povos.

A Travessia Ecoturismo, está desenvolvendo na região uma nova forma de turismo conhecido como turismo voluntário. Em parceria com a instituição de caridade Câncer Research, que arrecada recursos para investir na pesquisa do câncer. Parte desses recursos são destinados a aquisição de materiais para reformar escolas em vários países. O projeto em 2008 consistiu na construção de três novas salas de aula no povoado do Engenho II para o ensino de segundo grau e escola técnica. O trabalho irá beneficiar a população e a reduzir o problema que a comunidade Calunga enfrenta. Os jovens vão para a cidade estudar e a maioria não volta, tão pouco concluem o ensino. Com a iniciativa, já são identificadas o resgate das manifestações culturais mais expressivas de cada comunidade, que organizam apresentações mostrando a culinária, danças, musica e celebrações, tornando cada projeto uma grande vivência e buscando resgate cultural desse povo aguerrido, que preservam sua identidade e nos dias de hoje mantém seus costumes e tradições.

 

 

 

 
 
 
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