Estimados Amigos,
O mal tempo tem atrapalhado a nossa expedição nos últimos dias. Ao final da tarde as nuvens surgem rapidamente, tormentas elétricas, relâmpagos e trovões invadem a noite, acompanhados de uma chuva torrencial.
O tempo instável começou logo após a nossa escalada do Pissis (6.882m – a 3ª maior montanha das Américas). Assim que saímos do seu acampamento-base nuvens escuras nos envolveram, e sob fortes trovoadas desabou a chuvarada.
Por um lado, a chuva é bem vinda por aqui, uma região extremamente seca (noroeste da Argentina / Andes Centrais), por outro lado ela, além de atrapalhar as nossas escaladas, cria uma série de problemas, estradas ficam interrompidas por quedas de barreiras ou enchentes repentinas, cidades ficam sem água ou energia elétrica, e o granizo acaba destruindo telhados e danificando carros – é o que vimos nesses últimos dias, tudo muito divulgado na televisão local.
Fomos até o Famatina, uma montanha de 6 mil metros que está enfrentando uma polêmica situação, pois o Governo está tentando reabrir a exploração da Mina La Mejicana (ouro, prata e cobre), mas a população da pequena cidade é totalmente contra e prega “El Famatina no se toca”, para evitar a poluição de suas escassas águas e um caos ambiental generalizado. Um belo exemplo de amor à natureza e de coragem!
Pois bem, no Famatina, já estávamos bem instalados nas ruínas da Mina La Mejicana, a 4.500m, que usamos como acampamento-base, e vimos nossa tentativa de ataque ao cume frustrada por uma tempestade que virou a noite. Quando amanheceu o dia o céu ainda trazia nuvens pesadas e preocupados começamos a deixar a montanha, pois a precária estrada de terra muitas vezes era o próprio leito de um rio com águas cada vez mais agitadas.
Queríamos ter ido ao Bonete (6.759m), outra das grandes montanhas do Mundo Andino, mas a previsão era de “60 cm de neve”, acampamos perto, de madrugada mais uma forte tempestade, raios, trovões, vento forte. Seguimos viagem, mas tivemos que esperar por três horas máquinas desobstruírem a estrada destruída mais uma vez pelas chuvas.
Nessa expedição, minha ideia é não perder tempo, e seguir o roteiro planejado para cobrir mais uma região dos Andes, visando os objetivos do Projeto Mundo Andino. Assim seguimos em frente e chegamos então a Barreal, pequena cidade perto de San Juan, para enfrentar o Mercedário, mas, lógico, com o tempo instável, tivemos que criar uma estratégia ousada para garantir o sucesso de nossa escalada, algo que já havíamos feito no Pissis, fazer uma escalada rápida e precisa, aproveitando as manhãs quando o tempo é mais estável.
Bem, se você é alpinista ou conhece um pouco de montanha, vai ver que a nossa escalada do Mercedário foi uma verdadeira epopeia.
A Andina, enfrentando 80 km de estrada de terra, nos levou até os 3.100m do Refúgio Laguna Blanca. Atravessar o Rio Colorados foi “com emoção”, trinta metros de águas barrentas e caudalosas. E depois ficamos duas horas esperando funcionários da mineradora Pachón reconstruírem um trecho da estrada que havia sido levada por uma enxurrada.
No dia seguinte eu e o Pedro Hauck começamos a caminhar às 6 da manhã, vencemos 2 mil metros de desnível em dez horas, para acampar a 5.100m de altitude, debaixo de uma forte nevasca, o que apenas nos cofirmou que tínhamos que aproveitar o tempo bom pela manhã.
Resolvemos então partir à meia noite, e não às 3 da madrugada, como tínhamos feito nas outras montanhas. Só que à meia noite estava chovendo, resolvemos esperar. Meia noite e meia, ainda chovendo, resolvemos começar a escalada assim mesmo. A chuva foi se transformando em neve, e depois de uma hora parou. De olhos grudados no GPS o Pedro guiava o meu caminho “mais para a esquerda, agora para a direita”. O caminho estava debaixo de 20 cm de neve, o GPS é quem nos indicava para aonde ir.
Amanheceu então um dia lindo, e ainda tínhamos 700m do total de 1.770 de desnível a percorrer. Só chegamos ao cume às 13 horas, mas conseguimos! Na volta o vento já tinha apagado nossas pegadas, tivemos que abrir caminho novamente, e chegamos ao nosso acampamento apenas às 17h40. Desmontamos a barraca e debaixo de chuva andamos os 12 km até o Refugio, aonde chegamos super cansados, mas muito felizes!
Namastê!
Waldemar Niclevicz
www.niclevicz.com.br
|