Tenho uma grande paixão pela vida, e enquanto ela durar, a fonte dessas histórias dificilmente se esgotará. Sorte dos leitores que se sentem atraídos pela aventura, porque aos poucos um tesouro se revelará através de muitas experiências que já vivenciei. Compartilhar minha jornada é uma forma de terapia, mas, além disso, é também um exercício de pesquisa e exploração, o que tem sido um interessante atrativo para mim nesse universo. Eu quero conhecer o mundo, e por isso, estou buscando ampliar meus horizontes e expandir meus limites. Quem estiver ligado a essa filosofia e estilo de vida, entre nessa viagem comigo, garanto que será viciante. Seus dias serão muito mais excitantes depois de se permitir conhecer essa odisseia minimalista.
Nesse artigo, escrevo sobre uma viagem profunda aos costumes e história da Índia. Na virada do ano passado, entramos num mundo novo, apenas conhecido através da literatura. A Índia é um caos populacional em harmonia, onde passamos uma experiência marcante em poucos dias é preciso dizer, mas numa terra tão distante e cheia de surpresas que só aumentou o desejo de voltar.
Viajamos por três dias para chegar ao país. Depois de sair do Brasil em 27 de dezembro de 2012, pegamos um voo via Singapore Airlines, uma experiência incrível com serviço de bordo de alto nível, passando por duas conexões, a primeira em Barcelona após 11 horas de voo no dia seguinte e outra em Cingapura após mais 8 horas de voo. A terceira etapa do voo teria mais 5 horas com destino a Mumbai. Já em 29 de dezembro, após chegarmos ao nosso destino, percebemos que uma nova cultura e rotina nos seriam apresentadas com a profusão típica das grandes metrópoles. Na verdade, recebemos um choque enorme pela quantidade de pessoas, carros e outros meios de transporte todos misturados nas vias. Um caos vivendo em harmonia. Nessa região da costa oeste da Índia o clima era de calor. Aproveitamos nosso primeiro dia em terras asiáticas para nos organizar, revisar o roteiro, trocar dólares por rúpias e comprar a passagem de trem para Goa, nosso destino para o Réveillon. Fomos recebidos com o assédio constante de vendedores ambulantes, pedintes e religiosos. Um deles nos presenteou com uma pulseira de flores ligada à crença hindu, que veio para nos abençoar durante todo o dia. Agradecemos em hindi: Dhanyavada! Caminhando a pé pela cidade, passamos em frente ao “Gateway of India”, vimos uma quantidade absurda de turistas locais e estrangeiros, depois entramos no luxuoso hotel “The Taj Mahal Palace”, onde nos infiltramos como falsos hóspedes e vimos até uma noiva indiana lindíssima... Passamos próximo a alguns guetos ou favelas tentando encontrar o Mercado Colaba, esse sem sucesso. Durante a tarde visitamos alguns pontos turísticos conhecidos, já tentando nos acostumar à loucura indiana, aos sons das buzinas e a sua culinária. Por falar em culinária, logo procuramos provar uma das principais iguarias indianas, as samosas (chamuça em português), um bolinho frito ou cozido com um recheio saboroso, como batatas temperadas, cordeiro moído, carne moída, frango, entre outros. Seu tamanho e consistência podem variar, mas geralmente, são nitidamente triangulares, frequentemente acompanhadas de chutney (condimento de paladar agridoce, picante). As samosas são um aperitivo popular ou lanche na Índia, e em outros países asiáticos ou arábicos. Na Índia encontramos mais as samosas vegetarianas. Caminhamos em direção ao norte da cidade pela avenida Mahatma Gandhi e visitamos alguns locais, como a “Fashion Street”, o Azad Maidan, parte de uma enorme praça pública populosa, e quando encontramos o Mercado Crawford no final do dia, as vias já estavam intransitáveis, ou melhor, sempre estavam. Com a fome batendo, paramos nas proximidades para um lanche típico. Pedir algo sem pimenta era quase uma ofensa, já que a sensação picante graças ao “curry” faz parte da culinária indiana. O curry (caril em português) é uma mistura de especiarias muito utilizada na culinária da Índia, Tailândia e outros países asiáticos. É também um preparado típico da culinária indo-portuguesa de Goa, por exemplo, outrora pertencente ao Estado Português da Índia. Um dos condimentos usados tradicionalmente por lá em vários pratos é a folha da murraya koenigii ou árvore-do-caril. O pó-de-caril é feito à base de pó de açafrão-da-terra, cardamomo, coentro, gengibre, cominho, casca de noz-moscada, cravinho, pimenta e canela. Inicialmente o “curry” servia para temperar exclusivamente o arroz, mas atualmente é usado para a confecção de inúmeras receitas, como o frango de caril. Também, compramos algumas lembranças e roupas indianas e no final da noite tomamos nossa primeira cerva da viagem, uma Tuborg, no tradicional Leopold Cafe. Na verdade, durante o voo da Singapore Airlines foram várias latinhas da cerveja Tiger de Cingapura. Pernoitamos num pequeno hotel no centro de Mumbai.
No dia seguinte, 30 de dezembro, a viagem de trem ao sul do país, com destino a Goa, se iniciava como uma longa jornada, prevista para durar 8 horas. Um ar de mistério pairava no ar. Na ocasião, a Índia vivia um clima de tensão em função de um crime ocorrido na capital Nova Délhi, onde uma jovem sofreu um atentado contra a vida dentro de um vagão de trem. Essa jovem indiana de 23 anos, de nome não divulgado, havia morrido na véspera de nossa viagem à Goa, durante o período de internação num hospital em Cingapura em função das inúmeras lesões sofridas durante o estupro coletivo. A notícia corria todo o país e as manifestações tomavam conta das ruas. Enquanto isso, éramos apresentados às instalações simples da estação de trem de Dadar Central. As pessoas esperam deitadas no chão, o clima era fresco, pois era madrugada ainda, e a limpeza era quase nenhuma. Nos dirigimos ao vagão “Janshatabdi Express” correspondente aos nossos assentos, mas as luzes ainda estavam apagadas. Enquanto esperávamos, ficamos observando o ambiente, as pessoas, os hábitos, tudo novo para nós. Havia um vagão exclusivo para mulheres (“Ladies Coach”), havia postos de vendas ambulantes com o chá típico indiano “masala chai”, havia de tudo. O “masala chai” é um saboroso chá feito por infusão de chá preto com uma mistura de especiarias indianas aromáticas e ervas. Originário do sul da Ásia, a bebida ganhou popularidade em todo o mundo, tornando-se uma característica em muitas casas de chá e café. Embora tradicionalmente preparada por cozimento, as versões de varejo incluem sacos de chá de infusão, misturas em pó instantâneo e seus concentrados. Em muitos lugares, há um equívoco que o próprio “chai” seja feito com cardamomo, gengibre, e os outros temperos comuns. No entanto, “chai” é simplesmente a palavra hindi para chá, que pode ser preparado preto, com leite, sem açúcar, dentre outras maneiras. Assim que as luzes se acenderam entramos no vagão e percebemos a presença de uma família enorme, com seu patrono cuidando de filhos e esposa. Tudo muito tranquilo, e assim aproveitamos a viagem ao máximo com leituras locais curiosas, como o Bombay Times, nossos livros e o guia Lonely Planet, além da paisagem empoeirada que nos encantou. Durante a viagem provamos uma quentinha com arroz e frango ao “curry”, muito “curry”. Mas, rapidamente fomos salvos por vários goles de Mirinda. Saúde! Chegando a Goa nos dirigimos à pousada utilizando um riquixá movido a bateria. O riquixá (em inglês “rickshaw”) é um meio de transporte de tração humana em que uma pessoa puxa uma carroça de duas rodas onde se acomodam mais uma ou duas pessoas. O vocábulo riquixá tem origem na Ásia onde eram amplamente utilizados como meio de transporte pela elite. Atualmente, no entanto, os riquixás foram proibidos em muitos países asiáticos em decorrência dos numerosos acidentes. Em Goa nos ambientamos e logo organizamos tudo para os próximos dias. O calor nos animou, pois era litoral, então corremos para a praia. Mapas na mão, lista de locais a visitar e à noite fomos a um dos restaurantes transados da Vagator Beach Road para jantar, muito bem frequentado por sinal, a maior parte de turistas estrangeiros. Lá provamos uma cerveja local, a Kingfisher, envasada em Bangalore, uma saborosa “light beer”, que naquela altura da noite caiu como um refresco. Pernoitamos numa guest house, por sinal, muito agradável e bem localizada em Goa, administrada por uma família simpática descendente de portugueses.
Durante o dia seguinte, véspera do Réveillon, dia 31 de dezembro, saboreamos um café da manhã típico indiano, regado a frutas, “chapati” e “masala chai”. “Chapati” é um pão típico da culinária indo-portuguesa de Goa, Damão e Diu, outrora pertencentes ao Estado Português da Índia. Os “chapatis” são preparados com uma farinha de trigo integral especial, tradicional da Índia, também denominada “chapati”. Estes pães são normalmente consumidos no desjejum, podendo, no entanto, serem consumidos em qualquer refeição ao longo do dia, de preferência quentes. Além da farinha de trigo integral, pode incluir açúcar, manteiga, óleo e sal. Com estes ingredientes é formada uma massa, que é usada para fazer os pãezinhos achatados com 15 centímetros de diâmetro em média. Estes são depois cozinhados numa frigideira e podem ser consumidos como acompanhamento de pratos ao “curry”. O “chapati” é também típico da culinária do Paquistão. Depois do desjejum, partimos para conhecer as praias da região, a pacata Vagator e a badalada Anjuna. Nos divertimos vendo as vacas transitando com naturalidade nas areias, rimos das sungas gigantes dos indianos, sempre todos juntos e abraçados, costume muito comum na sua cultura, e as senhoras que nos assediavam constantemente para vender bijuterias, artesanato, roupas típicas, entre outras quinquilharias. Depois de recusar inúmeras ofertas dos vendedores ambulantes, aprendemos o significado de “No Namastê”. Nada mais do que uma forma polida de mandar você para aquele lugar... Depois de muito sol, cerveja, mar e leitura, conhecemos a vila de Anjuna. Voltando a Vagator encontramos um bom restaurante grego para jantar. Bem localizado e com vista para a praia fizemos nossa ceia e depois de um descanso, já à noite, partimos para a praia de Anjuna para celebrar o Réveillon. Em Anjuna são inúmeras festas fechadas. Goa é a capital da “Trance Music”, onde as “raves” nasceram. Mas, a grande quantidade de indianos dificultava nossa escolha, pois tivemos pouco tempo para nos ambientar e descobrir as melhores festas. Tivemos contato com poucos turistas nesses dois dias em Goa, a maioria de origem russa, e que não tinham muita informação para compartilhar. Apesar disso, um deles nos ensinou o nome de uma iguaria típica de seu país, os “snakes” (“snacks”), também conhecido como tira gosto ou petisco... hahaha! Enfim, apreciamos a queima de fogos, curtimos um pouco o ambiente e o movimento nas areias da praia, mas voltamos cedo para nossa pousada. Pernoitamos na guest house com piscina e quarto aconchegante.
Feliz Ano Novo! Em Goa o movimento estava fantasmagórico na manhã do primeiro dia do ano de 2013. Nenhuma alma viva nas ruas. Parecia que um ciclone havia passado por ali. Aproveitamos para andar um pouco nas praias e preparar nosso roteiro rumo ao norte do país, com a opção de voltar para Mumbai de trem para economizar um pouco de grana, e já pensando em visitar os pontos turísticos principais que havíamos escolhido consultando o guia da Lonely Planet. A viagem de volta foi bem cansativa, mas foi uma experiência necessária para que pudéssemos vivenciar de perto sua cultura e rotina. Foram quase 10 horas de viagem de volta a Mumbai, sentados em nossas mochilas no corredor entre dois vagões. Uma situação que poderíamos evitar no futuro, porém foi nessas condições que pudemos ver de perto como uma família Indiana viaja junto e se ajudando, dividindo alimento, espaço e cuidando uns dos outros. Vimos ainda os ambulantes promovendo o comércio de alimentos, o trânsito de funcionários do trem, especialmente para a venda de lanches e o “masala chai”, além do sincretismo de culturas e costumes explícito pela existência de dois banheiros, um oriental e outro ocidental (com privada). Chegamos à noite em Mumbai, cansados, mas cheios de planos. Fomos direto para o mesmo hotelzinho da semana anterior no centro de Mumbai. Compramos uns lanches no Starbucks – isso mesmo, tinha um ao lado do nosso hotel – pois no dia seguinte, logo cedo, já tínhamos que partir para o aeroporto pra tentar comprar as passagens para a capital Nova Délhi. Pernoitamos num quartinho pequeno, mas confortável, com banho quente e banheiro limpo.
Chegamos ao aeroporto cedo, na manhã de 2 de janeiro, e por sorte encontramos um voo barato da IndiGo com partida marcada para logo em seguida a Nova Délhi. Foi uma viagem rápida e interessante, pois avistamos a Índia de cima e o que vimos foi um cenário de poeira suspensa quase intransponível, impedindo que a geografia se revelasse. No aeroporto pegamos um ônibus e durante o trajeto minha namorada foi logo reservando o hotel ao lado da Connaught Place, ou seja, na melhor região de Nova Délhi, tudo via celular pelo Booking.com. Durante as viagens, sempre dividimos as responsabilidades, assim fica tudo mais fácil. Ficamos num lugar super agradável, um quarto bem limpo e próximo de tudo aquilo que gostaríamos de visitar. Um contratempo apenas poderia não ter ocorrido, mas serviu de experiência também. Fomos abordados por uma dupla de vigaristas que tentou nos ludibriar para depois roubar. Graças à genética tupiniquim percebemos logo a armação e saímos pela tangente. No mesmo dia buscamos informação para os próximos passeios, que incluíam as cidades de Agra e Varanasi. Numa agência de turismo vizinha ao hotel, nos surpreendemos ao descobrir que na época de nossa viagem a neblina impedia que a rede ferroviária operasse normalmente. Este imprevisto ocorreu, mesmo depois de realizarmos muitas pesquisas e leituras sobre a região, tanto em sites de internet, como nos livros e guias turísticos internacionais. Como nosso tempo era limitado e tínhamos muito a visitar, além da viagem ao Nepal (artigo de 8 de setembro) em seguida, não poderíamos esperar sem um previsão segura o trem para essas cidades. Logo, alugamos um carro com motorista para uma viagem de um dia, bate-e-volta maluco para Agra, e assim poderíamos visitar o tão cobiçado Taj Mahal e as outras atrações da região. Aproveitamos para incluir no roteiro um “city-tour” completo pela capital indiana com o mesmo motorista, assim ganharíamos tempo ao cobrir um grande número de pontos turísticos que havíamos listado como obrigatórios. Uma mudança se notava nessa região mais ao norte da Índia, o clima já era mais frio. No restante do dia visitamos o comércio ao redor da Rajiv Chowk no centro de Connaught Place. Pernoitamos no hotelzinho agradável. Detalhe, em todos os banheiros sempre havia um balde e uma torneira baixa para o toalete tradicional indiano.
Acordamos cedo no dia 3 de janeiro para começar o circuito que incluía visitas aos principais pontos turísticos da capital indiana Nova Délhi. Começamos pelo Birla Temple (Shri Lakshmi Narayan), e vimos que para entrar em monumentos como esses, de grande valor religioso e arquitetônico, era necessário retirar os calçados ou então, deveríamos colocar uma botinha de pano para não permitir contato direto do solado com o piso. O Birla Temple é um templo hindu dedicado a Laxminarayan em Nova Délhi. Laxminarayan geralmente refere-se à Vishnu, o preservador em Trimurti, também conhecido como Narayan, quando ele está com sua esposa Lakshmi. O templo, inaugurado por Mahatma Gandhi, foi construído entre 1933 e 1939. Os templos secundários são dedicados à Shiva, Krishna e Buda. O templo, instalado num terreno de 30.000 m2 com área construída de 2.100 m2, é adornado com muitos santuários, fontes e um grande jardim, e também casas Geeta Bhawan para discursos. O templo é uma das principais atrações da capital e atrai milhares de devotos nos festivais hindu de Diwali e Janmashtami. Um símbolo bastante presente nesse templo é a suástica ou cruz gamada. A suástica é um símbolo místico encontrado em muitas culturas em tempos diferentes, dos índios Hopi aos Astecas, dos Celtas aos Budistas, dos Gregos aos Hindus. Alguns autores acreditam que a suástica tem um valor especial por ser encontrada em muitas culturas sem contato umas com as outras. A imagem da cruz suástica é um dos amuletos mais antigos e universais, sendo utilizada desde o Período Neolítico. A cruz suástica também é utilizada em diversas cerimônias civis e religiosas da Índia: muitos templos indianos, casamentos, festivais e celebrações são decorados com suásticas. O símbolo foi introduzido no sudeste asiático por reis hindus, e remanescentes desse período subsistem de forma integral no Hinduísmo balinês até os dias atuais, além de ser um símbolo bastante comum na Indonésia. Visitamos em seguida o Qutub Minar, a torre (minar) mais alta na Índia, originalmente um antigo monumento islâmico com inscrições em árabe, embora a coluna de ferro tenha algumas inscrições Brahmi, classificado pela UNESCO como Patrimônio da Humanidade. O Qutub Minar é feito de arenito vermelho e mármore. A torre tem 379 degraus, possui 72,5 metros de altura e tem um diâmetro na base de 14,3 metros, que se estreita para 2,7 metros no andar superior. A construção, iniciada em 1192 por Qutub-ud-din Aibak e concluída por Iltutmish, é cercada por várias outras estruturas e ruínas antigas e medievais, conhecidas coletivamente como o complexo Qutub. Já no caminho para o Lotus Temple, passamos ao lado do India Gate, naquele dia fechado devido às manifestações relativas ao crime cometido dias antes contra a vida da jovem indiana. Uma pena, pois é o monumento nacional da Índia, e está situado no coração de Nova Délhi, tendo sido projetado por Sir Edwin Lutyens. Originalmente, a estátua do imperador da Índia George V estava sob o dossel agora vago em frente ao India Gate, mas foi transferido para a Coronation Park, juntamente com uma série de outras estátuas do Raj britânico. Após a independência da Índia, o India Gate tornou-se o local do Túmulo do Soldado Desconhecido do Exército Indiano, conhecida como Amar Jawan Jyoti (“a chama do soldado imortal”). Bem, voltando à rota do dia, chegamos ao Lotus Temple, uma casa de adoração e uma atração destacada na cidade. Por sinal, sentimos uma paz incrível ao entrar no templo, pois existe uma energia espiritual de alto padrão girando em torno desse lugar. O templo foi projetado por Fariborz Sahba, um arquiteto iraniano. O templo levou seis anos para ser completado, sendo que a construção iniciou no dia 21 de abril de 1980, e o edifício foi formalmente dedicado à Unidade de Deus, Unidade da Religião e a Unidade da Humanidade em dezembro de 1986. A obra custou em torno de 20 milhões de dólares e ganhou várias premiações de arquitetura e apareceu em centenas de artigos de revistas e jornais. No total são 10.000 m² de mármore extraído das minas da Grécia para formar o templo. O mármore foi enviado à Itália onde cada pedaço foi cortado e enviado para a Índia. Antes de fechar o “city-tour” pela capital do país, visitamos o Humayun’s Tomb. Esse monumento inspira mistério, no entanto nada mais é do que o túmulo do imperador mongol Humayun. O túmulo foi encomendado por sua primeira esposa Bega Begum (Haji Begum) em 1569-70 e desenhado por Mirak Mirza Ghiyas, um arquiteto persa escolhido por ela. Foi o primeiro jardim-túmulo no subcontinente indiano, e está localizado em Nizamuddin Leste, perto da cidadela Dina-panah, também conhecida como Purana Qila (Old Fort), que Humayun fundou em 1533. Foi também a primeira estrutura a usar arenito vermelho em tal escala. O túmulo foi classificado como Patrimônio da Humanidade pela UNESCO em 1993, e desde então passou por um extenso trabalho de restauração. Além do compartimento principal da tumba de Humayun, vários monumentos menores pontilham o caminho que leva até ele, a partir da entrada principal a Oeste, incluindo uma que antecede o próprio túmulo principal por 20 anos, o complexo do túmulo de Isa Niyazi Khan, um nobre afegão da corte de Sher Shah Suri, da dinastia Suri, que lutou contra os mongóis, construído em 1547. O complexo engloba o principal túmulo do Imperador Humayun, que abriga os túmulos da própria Bega Begum, além de Hamida Begum, e também Dara Shikoh, grande bisneto de Humayun e filho do mais tarde imperador Shah Jahan, bem como numerosos outros mongóis. Esse monumento representou um salto na arquitetura mongol, e junto com o seu jardim Charbagh, típico de jardins persas, mas nunca visto antes na Índia, estabeleceu um precedente para a arquitetura mongol subsequente. É visto como um claro afastamento do bastante modesto mausoléu de seu pai, o primeiro imperador mongol Babur, chamado Bagh-e Babur (jardins de Babur) em Cabul, Afeganistão. Muito embora, o último tenha sido o primeiro imperador a iniciar a tradição de ser enterrado em um jardim paradisíaco. Nesse mesmo dia ainda, batemos perna para ir às lojas da estação de trem Rajiv Chowk, no centro de Connaught Place, e compramos mais algumas lembranças do país, incluindo roupas típicas como o sári, escolhido a dedo e feito sob medida para minha namorada. O sári ou saree é uma tira de pano sem costura, usada por mulheres, variando de quatro a nove metros de comprimento, que fica envolta sobre o corpo em vários estilos, e tem origem no subcontinente indiano. A palavra sári é derivada do sânscrito, que significa “faixa de pano” e sadi em Prakrit, e que foi corrompida para sári em hindi. A palavra “sattika” é mencionada por descrever trajes de mulheres na Índia antiga na literatura Budista Jainista chamada Jatakas. Isso poderia ser o equivalente ao sári dos dias modernos. O termo para corpete feminino, o “choli” é derivado de outro clã dominante do antigo Tamil Nadu, os Cholas. Rajatarangini (ou seja, o “rio dos reis”), uma obra literária do século X por Kalhana, afirma que o “choli” do Deccan foi introduzido sob a ordem real em Kashmir O conceito de Pallava, a peça final no sári, foi originado durante o período Pallavas e nomeado após o Pallavas, outro clã dominante da antiga Tamilakam. É muito popular na Índia, Bangladesh, Paquistão, Nepal, Sri Lanka, Birmânia, Malásia e Cingapura. O estilo mais comum é o sári enrolado em torno da cintura, com uma extremidade estendida sobre o ombro, mostrando a barriga. À noite comemos no McDonald’s indiano, única opção depois de começar a sentir os efeitos desagradáveis do excesso de condimentos picantes. Chegando lá, uma placa alertava: “Beef and Pork Products Not Sold Here” (Carnes Bovina e Suína Não São Vendidas Aqui). Voltamos para nosso hotelzinho com banheiro meio indiano meio ocidental.
O dia 4 de janeiro começava como um dos mais esperados de toda viagem. Nosso destino seria Agra, a antiga capital de Hindustan, às margens do rio Yamuna no estado de Uttar Pradesh, a pouco mais de 360 quilômetros a oeste da capital do estado, Lucknow, e 200 quilômetros ao sul da capital nacional Nova Délhi. Com uma população de mais de 1,6 milhões de habitantes é uma das cidades mais populosas do estado e a décima nona mais populosa da Índia. Seria o dia da visita ao Taj Mahal, um mausoléu e o mais conhecido dos monumentos do país, que se encontra classificado pela UNESCO como Patrimônio da Humanidade, a exemplo de outros monumentos que encontramos no país. Foi recentemente anunciado como uma das Novas Sete Maravilhas do Mundo Moderno em uma celebração em Lisboa no dia 7 de julho de 2007. A obra foi feita entre os anos de 1632 e 1653 com a força de cerca de 20 mil homens, trazidos de várias cidades do Oriente, para trabalhar no suntuoso monumento de mármore branco que o imperador Shah Jahan mandou construir em memória de sua esposa favorita, Aryumand Banu Begam, a quem chamava de Mumtaz Mahal (“A joia do palácio”). Ela morreu após dar à luz ao décimo quarto filho, tendo o Taj Mahal sido construído sobre seu túmulo, junto ao rio Yamuna. Assim, o Taj Mahal é também conhecido como a maior prova de amor do mundo, contendo inscrições retiradas do Corão. É incrustado com pedras semipreciosas, tais como o lápis-lazúli entre outras. Sua cúpula é costurada com fios de ouro. O edifício é flanqueado por duas mesquitas e cercado por quatro minaretes. Supõe-se que o imperador pretendesse fazer para ele próprio uma réplica do Taj Mahal original na outra margem do rio, em mármore preto, mas acabou deposto antes do início das obras por um de seus filhos. Em Agra tivemos nosso primeiro contato com os macacos “vira-latas”, soltos nas ruas, ariscos e tentando roubar alimentos dos turistas menos atentos. Também vimos os camelos utilizados como puxadores de carroças para turistas, uma espécie de riquixá animal. Fomos apresentados a um guia assim que chegamos a Agra, que apesar de não ter sido contratado se juntou ao nosso roteiro através da intervenção da agência que organizou nosso passeio ao Taj Mahal. No entanto, ao final, a gorjeta oferecida foi considerada por ele um insulto e devolvida como oferta para que comprássemos um refrigerante. Tenso! Coisa de mochileiros. Dispensamos o guia e seguimos para mais um ponto turístico da cidade, próximo aos jardins do Taj Mahal, um importante monumento mongol do século XVI conhecido como por “Agra Fort”, localizado na margem oposta do rio Yamuna com vista para o Taj Mahal. Esta poderosa fortaleza de arenito vermelho engloba, dentro de suas paredes vedadas de 2,5 quilômetros de comprimento, a cidade imperial dos governantes mongóis. É composto por muitos palácios de contos de fadas, como o palácio Jahangir e o Khas Mahal, construído por Shah Jahan, além de salas de audiência, como o Diwan-i-Khas, e duas lindas mesquitas. O forte pode ser mais precisamente descrito como uma cidade murada. Foi no “Agra Fort” que protagonizamos um escândalo ao nos beijarmos numa de suas praças internas, um local público. Beijo inocente, mas que causou risadas e gritos de jovens adolescentes. Foi inveja mesmo... hahaha! A viagem de carro entre Nova Délhi e Agra durou cerca de 3 horas na ida e mais 4 horas na volta. Foi bem cansativa, mas com a neblina e a impossibilidade de esperar o trem não nos restou outra opção se não contratar o serviço da agência. Aproveitamos o tempo para ler, dormir e pensar nos próximos dias da viagem. Ao chegar à Nova Délhi resgatamos o sári encomendado anteriormente no alfaiate indiano e comemos um lanche na rua. Pernoitamos no mini hotel charmoso, confortável e limpinho.
Começava o dia 5 de janeiro, e com pouco tempo para visitar a Índia. Em função dos problemas com o transporte público decidimos comprar as passagens de avião para Varanasi na mesma agência de turismo, mas apenas de ida, já que sua localização era metade do caminho à capital do Nepal, Kathmandu, nosso próximo destino. Varanasi, também chamada Benares ou Kashi, é uma cidade às margens do rio Ganges (Ganga), em Uttar Pradesh, a 320 quilômetros a sudeste da capital do estado, Lucknow. É a mais sagrada das sete cidades (Sapta Puri) no hinduísmo e jainismo. As outras seriam: Ayodhya, Mathura, Haridwar, Kanchipuram, Ujjain (Avanti) e Dwarka. Os hindus acreditam que a morte em Varanasi traz a salvação. Varanasi é um caldeirão onde tanto a vida e a morte se encontram. Também, é uma das mais antigas cidades continuamente habitadas do mundo e a mais antiga da Índia. Em Varanasi decidiríamos o que seria melhor, tomar um ônibus pelas estradas estreitas e perigosas em ascensão às montanhas nepalesas ou um voo de volta à Nova Délhi e depois outro à Kathmandu. Custo e tempo sempre eram os fatores que levávamos em consideração, mas a segurança acabava pesando quando reconhecíamos algum risco. Ao final, nos rendemos e compramos novas passagens de avião, pois nos desaconselharam a encarar a viagem de ônibus até a fronteira. Chegando a Varanasi, fomos recebidos no aeroporto pelo receptivo que nos levou diretamente para um hotel escolhido através do Booking.com. O valor da conta telefônica após a viagem foi pesado, mas a praticidade ao usar o celular para fazer reservas era tentador, e com isso conseguimos bons preços de estadia e ficamos livres para decidir tudo em cima da hora, sem ficar presos a roteiros. Ficamos há menos de 200 metros das margens do rio Ganges. Uma ansiedade pairava no ar, pois esse era mais um daqueles destinos tão esperados. Chegamos à cidade e já programamos o passeio de barco no rio para o final da tarde. Andamos pelas ruas da cidade para apreciar o comércio e percebemos um comportamento mais ameno da população. Não sofremos o mesmo assédio que em outras cidades indianas, de pedintes, vendedores, etc. Acreditamos que isso era fruto do respeito em relação a esse lugar, considerado o mais sagrado para o Hinduísmo, cuja população chega a aproximadamente três milhões de habitantes. Uma curiosidade. Soubemos que no mesmo dia de nossa chegada à Varanasi, Dalai Lama, líder religioso do Budismo Tibetano, encontrava-se a meros 100 quilômetros da nossa localização. Ficamos pensando na possibilidade de visitá-lo, mas não tínhamos tempo sobrando. À tarde compramos incenso, cd’s de música hindu e mantras, lembranças diversas e depois fomos comer na pizzaria Vaatika Cafe, indicação via Lonely Planet, muito agradável e às margens do rio Ganges. Foi um encontro emocionante ver de perto esse lugar sagrado para milhões de pessoas de diversas religiões. Também vimos crianças empinando suas pipas às margens do Ganges, nas plataformas e degraus dos Ghats ao longo do rio sagrado. A Índia tem uma antiga tradição com as pipas. Notamos que a temperatura caia rapidamente no final da tarde, então nos agasalhamos antes de sair para o passeio de barco no rio. Nosso guia remava e às vezes parava para resgatar algumas pipas que haviam caído em suas águas sagradas. Enquanto remava e se aproximava dos “Ghats” (local de cremação hindu) começamos a observar as cerimônias de cremação e ao nos aproximar vimos os corpos cheios de flores e adornos, enquanto seus familiares oravam. Foi um misto de admiração, respeito e estranheza que nos assoberbou. De qualquer forma, registramos as imagens e nos silenciamos. Uma frase escrita num muro de um dos Ghats ilustrou bem o que sentimos ali: “Fortunate are the people who reside on the banks of Ganga” (Felizes são aqueles que residem às margens do Ganges). A história para aquelas pessoas se fazia no exato momento em que testemunhávamos os fatos. Partimos mais ao sul do rio para o Ghat Dasashvamedha, onde o Puja vespertino já estava prestes a começar. Puja, que em sânscrito significa reverência, honra, adoração ou culto, é um ritual religioso realizado pelos hindus como uma oferenda a várias divindades, pessoas ilustres ou convidados especiais. Isto também tem sido seguido pelos budistas e sikhs para honrar várias crenças. No hinduísmo é feito em uma variedade de ocasiões e configurações, a partir do puja diário feito em casa, para cerimônias do templo e grandes festivais, ou para iniciar um novo empreendimento. Sentimos sua grandeza ao ver um ritual cheio de energia transmitido através da meditação, cantos e orações. Além disso, sentíamos o aroma do incenso ritmado pela dança dos monges que erguiam suas tochas, refletindo suas chamas nas águas do rio Ganges e sobre seus espectadores, o que criava uma atmosfera única com efeito sagrado. Foi uma experiência incrível! Retornamos ao hotel mais leves, mas já sentíamos saudades da Índia, pois no dia seguinte partiríamos para o Nepal. Nessa noite passei mal com o organismo um pouco saturado dos condimentos indianos. Pernoitamos no hotel de quarto com cama e banheiro conjugados. Um terror para um casal quando um deles passa mal com os efeitos dos condimentos indianos. Recomendamos levar protetor auricular, só que não!
Antes de sair para o aeroporto, aproveitamos a manhã livre do dia 6 de janeiro para visitar os Ghats a pé. Passamos ao lado de algumas cerimônias de cremação, vimos de perto os “Sadhus”. No hinduísmo, um termo comum para designar um místico, um asceta, um praticante de ioga ou um monge andarilho. “Sadhu” é também uma expressão em sânscrito e páli usada como interjeição para algo bem-sucedido ou realizado com perfeição. Muitas curiosidades nos chamaram a atenção, como as vacas que já nos eram familiares, os búfalos, os biguás voando baixo, homens fazendo a barba e cortando o cabelo às margens do rio, os que se banhavam em suas águas frias e não tão limpas assim, pelo menos nesse trecho de Varanasi vimos uma água turva e de forte odor, um “Sadhu” estrangeiro ou albino entre muitos outros, cada qual com a sua excentricidade, o odor e a fuligem saindo dos crematórios, as crianças jogando críquete, esporte mais popular da Índia, turistas fazendo sessões de massagem, o comércio local vendendo galões de plástico vazio para que os turistas levassem a água sagrada do rio como recordação para seu puja, todos os tipos de comida vendidos nas ruas, um açougueiro matando uma galinha ao vivo e um comboio pedestre levando um corpo a caminho de um Ghat. Pegamos nossas coisas no hotel e seguimos desesperados para o aeroporto super atrasados. Por sorte, um funcionário indiano nos ajudou a entrar no avião a menos de 10 minutos da decolagem. Milagre! Em Nova Délhi fizemos nossa conexão para Kathmandu, aonde chegaríamos ao final da noite para nos acomodar por duas noites antes de seguir rumo aos Himalayas (artigo de 8 de setembro).
Metafisicamente analisando, vejo a memória como uma dádiva que nos torna capaz de reviver momentos mágicos de nossas vidas. Eu fico pensando quão importante é ter a capacidade de lembrar fatos marcantes e sensações prazerosas que experimentamos. A cada dia transcorrido me sinto mais realizado, pois acredito que os momentos são únicos. Podemos reeditar nossa jornada, repassar pelos mesmos locais, estar com as mesmas pessoas que um dia já fizeram parte de nossa vida, talvez em momentos até melhores, mas aquilo que foi vivido num determinado espaço e tempo não volta mais. Se aproveitamos ou não a ocasião, passou! Agora, temos o presente para nos preocupar e o futuro reservado para novas aventuras e horizontes. Migrando de tempos em tempos, de uma alvorada a outra, com nossos próprios pés e sem muita ambição, apenas com o desejo de expandir e conquistar novas experiências terrenas, caminhamos como andarilhos que somos. Com a dignidade e respeito pelo alheio, amor ao próximo, compaixão pelos que tem na escassez seu modo de vida, admiração àqueles que podem nos oferecer algo que lhes sobra, temos a fé fortalecida. Seria ignorância pedir mais e melhor. Já temos o suficiente. Temos energia o bastante para continuar a busca pelos nossos sonhos. Então, é nesse espírito que vou me despedindo para nos reencontrarmos no próximo artigo.
Dhanyavada Índia!
Alguns números
Na Índia foram mais de 5.700 quilômetros em apenas 9 dias a pé e utilizando outros meios de transporte como o riquixá, carro, ônibus, trem e avião. O mapa com a rota completa percorrida na Índia está no seguinte link: http://goo.gl/maps/4JzvS e na foto 43.
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