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Eu tenho a convicção de que o mundo está dividido entre especialistas e generalistas. Os especialistas são aqueles que se apaixonam por uma atividade e se dedicam a ela com todas suas energias e geralmente se tornam super bons no que fazem. São os grandes escaladores de rocha, os kayakers de corredeira que vemos no Off descendo aquelas cachoeiras impossíveis, os montanhistas que fazem rotas novas em montanhas remotas ou escalam 8000s em incríveis expedições invernais. Eu não pertenço a este grupo embora muitas vezes os invejo por suas maravilhosas conquistas e proezas. Eu sou um generalista. Por toda minha vida experimentei todos os esportes que tive a oportunidade de participar e por muitos dediquei bastante tempo mas nunca com exclusividade. Quem lê meus artigos no Extremos e conhece um pouco do meu currículo pode estranhar ler isso já que associam meu nome a escalada de neve e gelo, Everest e Sete Cumes e com razão já que as montanhas ocuparam um lugar de destaque em meu coração e em minhas expedições. Mas paralelamente as minhas expedições de montanha fiz paraquedismo, kayak de corredeira, cicloturismo, maratonas, kayak oceânico, escalada em rocha, mountain bike e muitas outras coisas. Entre elas velejar...e é disso que se trata este artigo.
Paradoxalmente, apesar de não ter uma ligação muito forte com o mar, eu sempre fui apaixonado por veleiros. Veleiros me atraem por sua forma, sua beleza, sua elegância e pela liberdade que está associada a eles. Poucas coisas passam mais a ideia de liberdade do que um veleiro ancorado em uma isolada baia nos trópicos.
Muitos anos atrás procurando aprender um pouco de vela trabalhei como marinheiro por dois meses em um grande veleiro de 60 pés em Whitsundays na Austrália. Foram dias lindos navegando por entre lindas desabitadas ilhas tropicais apesar de trabalhar muito e de ser um trabalho bem pesado. Essa experiência só aguçou minha vontade de um dia ter um veleiro. Esta oportunidade veio em 2006 na Guatemala quando em um impulso comprei um veleiro de 36 pés com mais de 30 anos de idade e nele passei dois anos, trabalhando seis meses com meus grupos nas várias montanhas que guio e velejando seis meses entre Guatemala, Belize e Honduras. Mas, após dois anos, a vontade de realizar meus sonhos de escalar grandes montanhas foi mais forte do que a vontade de velejar e vendi o veleiro e me dediquei a minhas grandes expedições, o Cho Oyu, o Everest, os Sete Cumes e o Manaslu.
Agora, tendo realizado meus sonhos de grandes montanhas, meu coração mais uma vez se voltou para os veleiros e após vários meses de estudo e pesquisas decidi que havia chegado o momento de comprar um outro veleiro. Baseado em minha experiência com o primeiro veleiro resolvi desta vez comprar um barco maior, mais novo e ao invés de um mono casco como o outro optei por um catamarã. E assim nasceu o Good Karma de onde escrevo em uma noite linda de lua crescente com uma deliciosa brisa e apenas a música das pequenas ondas no casco de meu lindo barco. Após semanas de idas e voltas, burocracias com documentação, frustrações com as demoras, hoje saímos pela primeira vez com o Good Karma para duas semanas de vela de Martinica a Granada.
O processo todo começou com minha ida a Fort Lauderdale, próximo a Miami, uma das capitais de vela dos Estados Unidos. Cheguei lá logo após meu último trek ao campo base do Everest para checar alguns barcos que haviam se encaixado com o perfil que estava buscando. Há meses, quando a Kathy e eu começamos a buscar diferentes catamarãs, imediatamente nos apaixonamos por um 38 pés da marca Lagoon e centramos nossas buscas em barcos deste tipo no Caribe.
Após duas semanas em Miami achei um em Martinica que parecia ser o que buscávamos. Contratamos um perito para fazer uma avaliação superficial no veleiro e sua opinião foi de que era um bom barco. Voamos então para Martinica para uma avaliação mais completa tirando o barco da água e fazendo um teste de navegação. Mais uma vez o perito nos disse que o barco estava em boas condições apesar de ser um barco de charter. Claro que ele precisa de um pouco de trabalho para deixá-lo da maneira como queremos, mas isso faz parte da vida de veleiros. E hoje, após um mês desde que voei de Katmandu a Miami saímos com o Good Karma para nossa primeira velejada.
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Assim como da outra vez que comprei o veleiro contratei um instrutor de vela para ficar conosco a bordo por duas semanas para que eu relembre o que aprendi com ele 10 anos atrás e para a Kathy fazer um curso completo de vela já que todo este universo é completamente novo para ela.
Nossos planos são agora velejar até Granada e ficar lá por ao redor de um mês deixando o barco como queremos, nova pintura, radar, dessalinizador, equipamento de mergulho com compressor, rádio SSB, um novo charter plotter e manutenção geral que foi um pouco negligenciada pelo antigo dono. Depois disso voltarei ao plano do antigo barco, meses de vela alternados com meses nas montanhas com meus grupos mas também em minhas expedições privadas. Apesar de ser generalista, montanhas nunca deixarão de ser onde me sinto mais feliz e sempre farão parte integral de minha vida. Se a vida no veleiro será o que imagino ou será apenas uma coisa passageira apenas o tempo dirá. Mas uma coisa tenho certeza, não importa o que aconteça, ao seguir meu coração e meus sonhos eu nunca me arrependi.
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Pretendo manter um blog específico de nossas andanças pelo mundo com o veleiro já que é isso que a médio prazo pretendemos fazer. Após nos sentirmos confortáveis com o barco e com nossa habilidade de velejadores a ideia é cruzar o canal do Panamá e seguir para o Pacífico. Ao final de um período de vela deixaremos o barco em uma marina e voltaremos para as montanhas. Daí de volta ao barco e seguiremos de onde paramos....um lindo plano. Nos acompanhem!
Nasmatê
Manoel Morgado
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