Há muito tempo ouço falar nas montanhas Altai, cadeia que encampa partes da China, Kazaquistão, Sibéria e Mongólia. Quem primeiro me falou delas foi um russo que me contou das inúmeras possibilidades de trekking, rafting e escalada que esta região oferece. Desde então venho lendo esporadicamente o pouco que acho sobre a região. Mas, de alguma maneira sempre achei que seriam os Altai russos que exploraria primeiro. Mas, a Mongólia exercia também um grande fascínio e quanto mais lia sobre este único pais mais me dava vontade de viajar por lá. A oportunidade veio agora em junho e julho quando resolvi dedicar dois meses para viajar pelas várias regiões do país. Confesso que o primeiro mês foi muito decepcionante. Achei a paisagem do deserto de Gobi pouco atraente e as estepes monótonas. Para mim grande parte do encanto de uma viagem é o encontro com o povo local e em um país com mais de um milhão e meio de quilômetros quadrados e apenas 2 milhões e meio de habitantes espalhados por esta área enorme a chance de encontros é bem reduzida. Além disso, 50% da população é nômade e vivem razoavelmente isolados. Mas, as montanhas estavam lá nos esperando e eu depositava grande esperança de que esta parte do país seria especial e elas não me decepcionaram. A esta parte da viagem se juntaram a mim e a Lisete Florenzano três clientes que estavam inscritos para a escalada do Elbrus que por motivos políticos na região havia sido cancelada.
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Camping |
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Expedição |
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Mapa |
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Meninas locais |
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Caravana com camelos |
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Escalada Malchin |
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De volta ao campo alto do Khuiten |
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Nossa viagem começou com um vôo de 1600 km em um pequeno avião que pousou em uma pista de terra e nos mostrou uma cidade de aspecto desolado com construções em estilo soviético resquícios dos muitos anos em que a Mongólia esteve sob a esfera de influência russa. Mas, por outro lado, circulando pelo mercado onde fomos comprar os últimos viveres estavam rostos muito diferentes do que havíamos visto neste mês de viagens pela Mongólia. Esta região é habitada por imigrantes do Kazaquistão, rostos de expressões fortes, narizes aduncos e olhos surpreendentemente claros. Trajes tradicionais eram a norma e me lembrei com carinho das minhas andanças pela Ásia Central e da receptividade, simpatia e bondade dos muçulmanos desta região.
Para chegar até o começo do trekking percorremos 200 km em sete horas por uma linda porém precária estrada de terra. Deste ponto seguimos caminhando por seis dias por uma paisagem lindíssima com lagos glaciares refletindo montanhas nevadas, florestas temperadas de pinheiros, passos nas montanhas e vales semi áridos. A diversidade da paisagem era replicada pela variedade do clima. Um dia estávamos caminhando com camisetas de manga curta para em seguida termos de colocar fleeces e anorak sob uma nevasca com ventos fortíssimos. Mas, não foi só a natureza que surpreendeu nesta caminhada. Mais uma vez fiquei admirado com a hospitalidade dos muçulmanos desta parte do mundo. Não raro fomos convidados para entrar nas barracas dos nômades e nos foi servido queijo, yogurte, chá com sal, nata, e bolachas de fabricação caseira./ Em um momento particularmente tocando, duas meninas se aproximaram de nós e muito timidamente nos deram yogurte e queijo de cabra para em seguida saírem correndo dando risadas envergonhadas. Continuamos nosso trek com o coração cheio de alegria em ver que este tipo de coisa ainda acontece no mundo de hoje.
Nosso campo base e objetivo maior de nossa aventura era uma região gramada ao lado do maior glaciar do país e dele brotavam os cinco picos sagrados da região, entre eles o mais alto do pais, o Khuiten com 4374 metros o qual sonhávamos em fazer a primeira ascensão brasileira. Como aclimatação escalamos o Malchin com 4100 metros subindo entre rochas e neva fresca da tempestade do dia anterior. Do topo pudemos estudar a rota que seguiríamos no dia seguinte até o campo alto com 3600 metros de altitude.
A manhã nasceu limpa e saímos cedo para aproveitar a neve mais firme antes que o forte sol das montanhas deixasse o glaciar mais perigoso. Atravessamos ao redor de 15 cravasses grandes vendo o azul amedrontador de suas profundezas e chagamos ao campo alto já com o céu escuro, prenúncio de mais uma mudança de tempo. Fomos dormir com o suave mas inquietante ruído da neve cobrindo o teto e as laterais de nossas pequenas barracas.
Pela manhã, o vento levantava redemoinhos de neve do cume e vimos que teríamos de passar mais uma noite no incômodo campo alto para daí poder tentar o cume. Mas, subitamente o sol saiu, o vento parou completamente e um pouco depois já estávamos a caminho do cume. A escalada de 6 horas alternou-se entre seções fáceis com ângulos moderados até rampas de neve firme com 45 a 50 graus. Segui na frente abrindo a trilha e fazendo confortáveis degraus para meus clientes e quanto mais subia mais energizado me sentia com a paisagem que ia se descortinando ao nosso redor. E as 3 da tarde ainda com um tempo de sonho chegamos ao cume do Khuiten. Lisete Florenzano, José Roberto Resende, Eduardo Santos Filho e eu nos tornávamos os primeiros brasileiros a escalar o Khuiten. Nosso guia local beijou a neve do cume e fez as três prostrações budistas antes de começarmos a descer.
Enquanto via a paisagem árida e imutável das estepes mongóis planejava o roteiro da viagem do próximo ano, parecida com o que fizemos, mas com as mudanças que acontecem sempre após uma primeira viagem exploratória. E também pensava na viagem de moutain bike que quero oferecer, sonho antigo que agora encontrou o local ideal para fazer.
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