Enquanto pedalava pelo sul, Santa Catarina e Rio Grande, no mapeamento o meu livro – Guia de Trilhas Serra Geral (BluGrama) – tentei explicar a meu companheiro de pedal o que é meditação. Tarefa difícil...
Lembrei de um comediante, acho que francês, que dizia que “meditar é algo muito mais importante do que ficar sentado no chão sem fazer nada”... Ele fazia graça, mas disse a verdade. Meditar requer muito esforço, embora o corpo aparentemente não faça nada.
Gosto da imagem que ouvi de um professor de budismo, repetida depois algumas vezes por monges budistas que conheci... Na meditação a gente observa a mente como se fosse uma tela de cinema. É assim que eu tento agir, enquanto medito: puxo uma cadeira e me sento, no meio da minha mente, em silêncio e muito atento, sem crítica e sem tentar controlar, e observo as projeções que minha mente joga na tela que me circunda.
Lembranças, fantasias, emoções, sensações físicas e, entre uma imagem e outra, vislumbres da própria mente. Passado, futuro, prazer, desejos, dor e um padrão de agitação constante. Assim minha mente se manifesta. Inquieta, sempre ocupada, como se tudo nela fosse muito importante. Cheia de si e lotada com todo tipo de detalhe. Ou, em outras palavras... Fechada para tudo o que não é produto dela mesmo.
Meditar é tomar consciência, observar, analisar, entender que essas manifestações mentais têm origem, duração e término – como tudo no universo, inclusive o próprio universo. Nos raros intervalos entre uma onda de agitação e outra, aparecem espaços que não são vazios porque parecem conter absolutamente tudo. Se medito com regularidade e dedicação, esses espaços ficam mais frequentes e de maior duração. Sinto um certo alívio.
Somente no silêncio da mente consigo ouvir o mundo à minha volta...
Quando a mente não está ocupada fazendo tanto barulho, aparece o silêncio. O mundo à minha volta pode estar em carnaval, mas a mente fica em silêncio. Somente no silêncio da mente consigo ouvir o mundo à minha volta e, se estiver muito atento, consigo entendê-lo um pouco. Isso é meditar.
Obviamente não é preciso sentar no chão e fechar os olhos. Não é preciso se retirar para um canto escuro e silencioso. Mas esse isolamento ajuda no começo, porque não estamos habituados a prestar atenção no barulho da nossa mente ou a valorizar quando ela não está “ativa”. Achamos a agitação mental natural e até saudável.
Quando medito consigo abrir espaço na minha mente para apreciar – silenciosamente, sem a eterna voz do locutor (eu mesmo) que narra constantemente a vida na minha cabeça – o mundo à minha volta. Se estou, por exemplo, nos campos ondulantes de altitude da Serra Geral, polvilhado de bosques de araucárias e cortado por rios cristalinos correndo sobre lajes polidas de pedras, consigo beber o cenário com cada célula do meu corpo e não apenas com os olhos e a mente. Tudo parece mais vivo e presente.
Quer tentar?
Guilherme Cavallari,
autor de 18 livros sobre esportes e turismo de aventura, entre eles o recém-lançado “Transpatagônia, Pumas Não Comem Ciclistas”, tenta levar uma vida simples nas montanhas da Mantiqueira. Também colabora como colunista do Extremos desde 2010. |