Semana passada, mais exatamente dia 25/11, fez 10 anos que perdi um dos meus maiores amigos… Caraca, já faz 10 anos que o Carlinhos se foi!
A gente sabe que perdeu alguém realmente querido, quando 10 anos depois, essa pessoa ainda faz falta a cada dia; como se parecesse que foi ontem que demos as últimas risadas e escalamos as últimas vias.
Conheci o Carlinhos durante as obras da Casa de Pedra no início de 1998. No meio daquela bagunça de chapas de madeira e estruturas de ferro, com solda pingando e tantos outros perigos, me surge aquele muleque franzino de 13 anos de idade, uniforme da escola e aqueles olhões azuis arregalados de curiosidade.
Foi amor a primeira vista. Sim eu amava aquele muleque… Bicho de cidade, morava na ruazinha ao lado do ginásio. Nunca tinha visto uma cachoeira na vida, escalada então, não fazia idéia do que era.
Sua curiosidade e simpatia, assim como me ganhou, ganhou a todos durante os 5 anos em que viveu dentro da Casa de Pedra. Ajudava todo mundo, brincava e contava piadas; claro que sempre muuuito mais atencioso com as menininhas, mostrando tudo o que sabia. Ele tinha o dom de ser exibido sem ser arrogante! Tinha também o dom de dar nomes as agarras do ginásio e apelidos hilários para todos. Inclusive Hilário fazia parte de seu nome: Carlos Bortoleto Hilário.
O Carlinhos virou quase que um filho. Lhe ensinei tudo o que sabia de escalada, o levei para a rocha, e fizémos juntos sua primeira viagem internacional.
Rato de ginásio, era forte e malandro com as agarras de resina, mas nunca vou me esquecer de quando pela primeira vez em Joshua Tree, o coloquei num boulder de aderência de V1, onde ele não conseguiu tirar os pés do chão. “Como assim, eu escalo 9º grau na academia e não consego escalar um mísero V1, você tá me sacaneando!”
O Carlinhos se foi com apenas 18 anos mal completados, hoje teria 28! Eu fico imaginando qual teria sido seu destino. Que faculdade teria feito? Que via teríamos escalado? Como disse Carlos Dummond de Andrade: “Também temos saudades do que não existiu, e dói bastante.” Me dói imaginar tudo aquilo que não aconteceu. Me dói bastante escrever essa linhas, talvez por isso nunca tenha escrito nada antes. Acho que não era a hora ainda, mas agora já se passaram 10 anos; ironicamente a idade da minha filha Manu.
O Carlinhos conheceu a Manu mas conviveram muito pouco; só tenho uma foto dele a segurando no colo. Poucos meses depois desta foto ele se foi. Como eu aprendi com esse muleque!
Tenho certeza de uma coisa, o Carlinhos foi um anjo disfarçado de menino e assim como todos os anjos, não podia virar homem e se foi. Tenho certeza que o Carlinhos é o anjo da guarda da Manuela. Essa única foto desfocada me mostra sua alma.
Em julho de 2004 inauguramos a Casa de Pedra em Perdizes com o prédio em seu nome. Para quem nunca reparou ou entendeu aquela plaquinha ao lado da porta de entrada, agora está explicado.
Tenho certeza que o céu não é mais o mesmo. Agora as nuvens devem ter grau e setores como num guia de escalada. Deus responde por Chefia e São Pedro por Zé Trovão!
Como você faz falta muleque!
Alê Silva. |